quarta-feira, 25 de setembro de 2013

A REJEIÇÃO DE ISRAEL

A REJEIÇÃO DE ISRAEL
Por: Rev. David Chilton
Tradução: Rev. João Ricardo Ferreira de França.

Ele era como os que foram enviados pelo dono da casa para que recebessem os frutos da vinha dos lavradores; porque exortava a todos os homens a retomar o interesse. Porém, Israel o desprezou e não quis retornar, pois sua vontade não era correta, e além do mais mataram aos que haviam sido enviados, e nem sequer se detiveram de atentar contra o senhor da vinha, mas que o mataram. Certamente, quando chegou e não encontrou fruto neles, lhes maldisse por meio da figueira, dizendo; “Nunca mais nasça fruto de ti” [ Mateus 21.19]; e a figueira ficou morta, sem frutos, de forma que até os discípulos se maravilharam quando a figueira secou. Então se cumpriu o que foi dito pelo profeta: “Farei cessar entre eles a voz de folguedo e a de alegria, e a voz do noivo, e a da noiva, e o som das mós, e a luz do candeeiro.” (Jeremias 25.10 ARA). Porque a obra completa da lei tem sido abolida entre eles, e de agora em diante e para sempre permanecerão sem festas.
Atanásio, Letters [vi]
            Ler a Bíblia em termos do tema do paraíso pode aprofundar nossa compreensão sobre duas passagens mais familiares da Escritura. De repente, podemos entender por que, por exemplo, o Salmo 80 e Isaías 5 descrevem o povo do pacto como  “a vinha do Senhor”. Como temos visto, este era uma recordação do estado original do homem em comunhão com Deus no Éden. Também era um lembrete de que, quando Deus salva o seu povo, lhe constitui em Jardim renovado (ou vinha renovada), e assim, os escritores bíblicos usavam repetidas vezes as imagens de plantar, árvores, vinhas, e frutos para descrever a salvação em seus vários aspectos (João 15 é um exemplo bem conhecido). Contudo, também é importante reconhecer que as imagens do Jardim podem se usar para descrever a apostasia e a maldição, porque a primeira violação do pacto teve lugar no Éden. Deus havia dado a Adão uma comissão para que cultivasse e guardasse sua “vinha”; em lugar disso, Adão se havia rebelado contra o dono da terra, e havia sido amaldiçoado e expulso, perdendo sua herança. Esta imagem dupla da vinha como lugar, tanto de benção como de maldição, é um importante conceito na Bíblia, e se converteu no cenário de uma das mais notáveis parábolas de Jesus, a história dos lavradores maus ( Salmos 80 e Isaias 5 devem ser lidos junto com isto).
Havia um homem, dono de casa, que plantou uma vinha. Cercou-a de uma sebe, construiu nela um lagar, edificou-lhe uma torre e arrendou-a a uns lavradores. Depois, se ausentou do país. Ao tempo da colheita, enviou os seus servos aos lavradores, para receber os frutos que lhe tocavam.  E os lavradores, agarrando os servos, espancaram a um, mataram a outro e a outro apedrejaram.  Enviou ainda outros servos em maior número; e trataram-nos da mesma sorte. E, por último, enviou-lhes o seu próprio filho, dizendo: A meu filho respeitarão. Mas os lavradores, vendo o filho, disseram entre si: Este é o herdeiro; ora, vamos, matemo-lo e apoderemo-nos da sua herança. E, agarrando-o, lançaram-no fora da vinha e o mataram.
 (Mateus 21.33-39 ARA)
            Em sua graça, Deus havia enviado profetas a Israel ao longo de sua história, e os homens de Deus sempre havia sido tratados aleivosamente. “Foram apedrejados, provados, serrados pelo meio, mortos a fio de espada; andaram peregrinos, vestidos de peles de ovelhas e de cabras, necessitados, afligidos, maltratados (homens dos quais o mundo não era digno), errantes pelos desertos, pelos montes, pelas covas, pelos antros da terra.” (Hebreus 11.37-38 ARA). O fato é que Israel havia rejeitado consistentemente a palavra de Deus e maltratando aos profetas, desde o começo. Como lhes acusou Estevão (justamente antes de ser assassinado pelos líderes judeus):  “Homens de dura cerviz e incircuncisos de coração e de ouvidos, vós sempre resistis ao Espírito Santo; assim como fizeram vossos pais, também vós o fazeis. Qual dos profetas vossos pais não perseguiram? Eles mataram os que anteriormente anunciavam a vinda do Justo, do qual vós agora vos tornastes traidores e assassinos,” (Atos 7.51-52 ARA).
            O maléfico tratamento dos profetas por parte de Israel alcançou seu clímax no assassinato do Filho de Deus, como Jesus predisse em sua parábola. Logo perguntou a seus ouvintes:
Quando, pois, vier o senhor da vinha, que fará àqueles lavradores? Responderam-lhe: Fará perecer horrivelmente a estes malvados e arrendará a vinha a outros lavradores que lhe remetam os frutos nos seus devidos tempos. Perguntou-lhes Jesus: Nunca lestes nas Escrituras: A pedra que os construtores rejeitaram, essa veio a ser a principal pedra, angular; isto procede do Senhor e é maravilhoso aos nossos olhos? Portanto, vos digo que o reino de Deus vos será tirado e será entregue a um povo que lhe produza os respectivos frutos.
 (Mateus 21.40-43 ARA)
            Os judeus haviam pronunciado sua própria sentença de condenação. E certamente, a vinha lhes seria tirada; o Senhor viria e lhes destruiriam, e daria a vinha a trabalhadores obedientes que lhe redesse o fruto que Ele desejava. O reino seria tirado dos judeus e dado a outras “pessoas”. Quem seriam estas pessoas? Depois de citar o mesmo texto do Antigo Testamento  que Jesus havia usado, o apóstolo Pedro deu a resposta definitiva, escrevendo à igreja:
Vós, porém, sois raça eleita, sacerdócio real, nação santa, povo de propriedade exclusiva de Deus, a fim de proclamardes as virtudes daquele que vos chamou das trevas para a sua maravilhosa luz; vós, sim, que, antes, não éreis povo, mas, agora, sois povo de Deus, que não tínheis alcançado misericórdia, mas, agora, alcançastes misericórdia.
 (1ª Pedro 2.9-10 ARA)
            O argumento decisivo é que Deus havia usado esta mesma linguagem ao falar para o povo do pacto, Israel, no Monte Sinai. “sereis a minha propriedade peculiar dentre todos os povos [...] vós me sereis reino de sacerdotes e nação santa.” (Êxodo 19.5-6 ARA). Pedro disse que aquilo que uma vez era verdade com respeito a Israel, agora e para sempre é verdadeiro com respeito à igreja. Israel era um jardim, uma vinha, em rebeldia contra seu dono ou, para mudar a metáfora, uma arvora sem frutos, como disse Jesus em outra parábola:
Certo homem tinha uma figueira plantada na sua vinha e, vindo procurar fruto nela, não achou. Pelo que disse ao viticultor: Há três anos venho procurar fruto nesta figueira e não acho; podes cortá-la; para que está ela ainda ocupando inutilmente a terra?Ele, porém, respondeu: Senhor, deixa-a ainda este ano, até que eu escave ao redor dela e lhe ponha estrume. Se vier a dar fruto, bem está; se não, mandarás cortá-la.
 (Lucas 13.6-9 ARA)
            Jesus, o senhor da vinha, passou os três anos de seu ministério viajando por Israel buscando frutos. Agora era tempo de “corá-lo”. João, o Batista havia advertido aos judeus, ainda antes que Jesus começasse seu ministério, que a vinha de Israel estava-lhe terminando o seu tempo:
Produzi, pois, frutos dignos de arrependimento; e não comeceis a dizer entre vós mesmos: Temos por pai a Abraão; porque eu vos afirmo que destas pedras Deus pode suscitar filhos a Abraão. Já está posto o machado à raiz das árvores; toda árvore, pois, que não produz bom fruto é cortada e lançada ao fogo.
 (Mateus 3.8-10 ARA)
            Este era o problema com Israel. Ainda que os judeus tivessem dado boas-vindas a Jesus em Jerusalém fazendo-o andar sob os ramos de árvores como reconhecimento de sua vinda e restauração do Éden. (Mateus 21.8-9), os ramos não tinham frutos. De maneira interessante, a mesma passagem continua e mostra o que sucedeu depois que Jesus se foi de Jerusalém. Enquanto caminhava, encontrou uma figueira e buscou frutos, porém não encontrou nenhum. Assim prontamente amaldiçoou a figueira, dizendo: “Nunca mais nasça frutos de ti”. E imediatamente a figueira secou (Mateus 21.18-19). O mesmo ocorrerá ao Israel estéril e impenitente.
A Geração Terminal
            Claro que, a culpa recaiu principalmente nos líderes do Israel, os cegos guias dos cegos, que conduziam a nação inteira para o buraco (Mateus 15.14). Por isso, Jesus diria particularmente suas acusações iradas contra eles (veja-se Mateus 23). Porém incluía também ao povo em geral em sua condenação, como podemos ver nas palavras finais de sua última mensagem pública:
Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas, porque edificais os sepulcros dos profetas, adornais os túmulos dos justos e dizeis: Se tivéssemos vivido nos dias de nossos pais, não teríamos sido seus cúmplices no sangue dos profetas! Assim, contra vós mesmos, testificais que sois filhos dos que mataram os profetas. Enchei vós, pois, a medida de vossos pais. Serpentes, raça de víboras! Como escapareis da condenação do inferno? Por isso, eis que eu vos envio profetas, sábios e escribas. A uns matareis e crucificareis; a outros açoitareis nas vossas sinagogas e perseguireis de cidade em cidade; para que sobre vós recaia todo o sangue justo derramado sobre a terra, desde o sangue do justo Abel até ao sangue de Zacarias, filho de Baraquias, a quem matastes entre o santuário e o altar. Em verdade vos digo que todas estas coisas hão de vir sobre a presente geração.
 (Mateus 23.29-36 ARA)
            Os pecados de Israel, suas rebeliões e suas apostasias, se haviam estado acumulando por séculos, enchendo o cálice até transbordar. O ponto crítico chegou quando veio o Filho. Sua rejeição dEle selou sua sorte, e por sua vez foram rejeitados por Deus. A geração que crucificou ao Senhor e perseguiu seus apóstolos era a verdadeira “geração terminal”. Israel, como o povo do pacto, havia de ser destruído, final e irrevogavelmente. Havia recebido a advertência final. Anos mais tarde, pouco antes de que o holocausto do ano 70 d.C. descesse sobre Israel, o apóstolo Paulo escreveu que “os judeus, os quais não somente mataram o Senhor Jesus e os profetas, como também nos perseguiram, e não agradam a Deus, e são adversários de todos os homens, a ponto de nos impedirem de falar aos gentios para que estes sejam salvos, a fim de irem enchendo sempre a medida de seus pecados. A ira, porém, sobreveio contra eles, definitivamente”. (1ª Tessalonicenses 2.14-16 ARA)
            Como nação, Israel havia se convertido em apóstata, uma prostituta espiritual em rebeldia contra seu Esposo (veja-se Ezequiel 16). As terríveis palavras de Hebreus 6.4-8 se aplicam literalmente à nação do pacto, que havia renunciado a sua primogenitura:
É impossível, pois, que aqueles que uma vez foram iluminados, e provaram o dom celestial, e se tornaram participantes do Espírito Santo, e provaram a boa palavra de Deus e os poderes do mundo vindouro, e caíram, sim, é impossível outra vez renová-los para arrependimento, visto que, de novo, estão crucificando para si mesmos o Filho de Deus e expondo-o à ignomínia. Porque a terra que absorve a chuva que freqüentemente cai sobre ela e produz erva útil para aqueles por quem é também cultivada recebe bênção da parte de Deus; mas, se produz espinhos e abrolhos, é rejeitada e perto está da maldição; e o seu fim é ser queimada.
            A mesma multidão que deu boas-vindas a Jesus em Jerusalém com hosanas clamou por seu sangue em menos de uma semana. Como todos os escravos, sua atitude era inconstante; porém, finalmente, sua atitude se resumiu em outras parábolas de Jesus: “Não queremos que este reine sobre nós.” (Luca 19.14 ARA) Os principais sacerdotes revelaram a fé da nação quando negaram veementemente o senhorio de Cristo e afirmaram: “Não temos rei, senão César!” (João 19.15 ARA).
            Assim que o povo do pacto herdou a maldição. Haviam feito os ramos ondularem direção do filho do dono quanto entrou na vinha, aparentemente para dar-lhe boas-vindas em sua propriedade legal; mas, quando Ele chegou mais perto e inspecionou os ramos, não encontrou nenhum fruto – somente folhas. Para conservar o modelo que temos visto em nosso estudo do Jardim do Éden, Israel estava maduro para ser julgado, deserdado, e expulso da vinha.
            Porém, não somente tinha os exemplos do Éden, o dilúvio, Babel, e outros juízos históricos como admoestações. Por meio de Moisés, Deus havia dito especificamente que a maldição cairia sobre eles se apostassem da verdadeira fé. Faríamos bem em recordar para nós mesmos as advertências de Deuteronômio 28, onde Deus ameaça com a perda da família e as possessões, ser assolados por diversas enfermidades, sofrer a causa da guerra e a opressão por uma nação pagã vitoriosa, voltar-se ao canibalismo por causa da fome tremenda, e ser vendidos como escravos e dispensados sobre a face da terra.
Assim como o SENHOR se alegrava em vós outros, em fazer-vos bem e multiplicar-vos, da mesma sorte o SENHOR se alegrará em vos fazer perecer e vos destruir; sereis desarraigados da terra à qual passais para possuí-la. O SENHOR vos espalhará entre todos os povos, de uma até à outra extremidade da terra. Servirás ali a outros deuses que não conheceste, nem tu, nem teus pais; servirás à madeira e à pedra. Nem ainda entre estas nações descansarás, nem a planta de teu pé terá repouso, porquanto o SENHOR ali te dará coração tremente, olhos mortiços e desmaio de alma. A tua vida estará suspensa como por um fio diante de ti; terás pavor de noite e de dia e não crerás na tua vida. Pela manhã dirás: Ah! Quem me dera ver a noite! E, à noitinha, dirás: Ah! Quem me dera ver a manhã! Isso pelo pavor que sentirás no coração e pelo espetáculo que terás diante dos olhos.
 (Deuteronômio 28.63-67 ARA)
            A causa de Israel haver cometido o supremo ato de violação do pacto ao rejeitar a Cristo, o próprio Israel foi rejeitado por Deus. As terríveis maldições pronunciadas por Jesus, Moisés, e os profetas se cumpriram na terrível destruição de Jerusalém, na desolação do templo e a desaparecimento da nação do pacto no ano 70 d.C. (veja-se o Apêndice B para ler a descrição deste evento, e compará-la com as maldições descritas em Deuteronômio 28). Tal como Deus havia prometido, o reino foi realmente estabelecido quando Cristo veio. Porém, em vez de abarcar e assimilar em sua estrutura ao Antigo Israel, o reino veio e fez pó a Israel. O novo templo de Deus, a igreja, foi estabelecido quando o antigo templo foi derribado e reduzido a escombros.









domingo, 1 de setembro de 2013

A VINDA DO REINO

A VINDA DO REINO
 Rev. David Chilton
Tradução: Rev. João Ricardo Ferreira de França.

Em seguida, ascenderá Salvador para o céu dos céus, levando nos pés a vitória, Triunfante de seus  inimigos e dos seus, em Sua ascensão surpreenderá a Serpente, como é o ar, e arrastando acorrentado em torno de seu império, a deixará por último confundida. Entrará prontamente em sua glória, e recuperará  o seu trono à mão direita de Deus, magnificamente exaltado acima de todas as honras do céu.
John Milton, Paraise Lost [12.451-58].

Nosso Senhor Jesus Cristo, que tomou sobre si a morte de todos, estendeu as mãos, não em qualquer lugar abaixo da terra, mas no mesmo ar, para a salvação efetuada por meio da  cruz pudesse ser mostrada a todos os homens em todos os lugares: destruindo o diabo trabalha  nos ares, e para que  Ele pudesse consagrar nosso caminho ao  céu, e liberá-lo.
Atanásio, Letters [xxii]

            Adão foi criado rei. Haveria de subjulgar a terra e tendo domínio sobre ela. Seu domínio, contudo, não era absoluto; Adão era um governante subordinado, um rei (príncipe) sob a autoridade de Deus. Era rei somente porque Deus lhe havia criado como tal e lhe havia ordenado reinar. O plano de Deus era que sua imagem reinasse no mundo sob suas leis e sua supervisão. Enquanto Adão fosse fiel a sua comissão, poderia ter domínio sobre a terra.
            Porém, Adão foi infiel. Não estava satisfeito com ser governante subordinado à imagem de Deus, aplicando as leis de Deus à criação, e quis ser autônomo. Quis ser seu próprio Deus, fazer suas próprias leis. Por este crime de rebelião, ele foi expulso do Éden. Porém, como temos visto nos capítulos anteriores, este incidente não fez abortar o plano de Deus de domínio por meio de sua imagem. O segundo Adão, Jesus Cristo, veio a cumprir a tarefa que o primeiro Adão não havia cumprido.
            Durante todo o Antigo Testamento, os profetas estavam cada vez mais o momento em que o Rei designado por Deus vim a sentar-se no trono. Um dos Salmos citados, geralmente, pelos escritores do Novo Testamento, mostra a Deus Pai dizendo ao seu Filho, o rei:
Pede-me, e eu te darei as nações por herança e as extremidades da terra por tua possessão. Com vara de ferro as regerás e as despedaçarás como um vaso de oleiro. (Salmos 2:8-9 ARA)”
            Os profetas deixaram bem claro que, como Adão, o rei que viria havia de reinar sobre o mundo inteiro (não somente sobre Israel): “Domine ele de mar a mar e desde o rio até aos confins da terra.  Curvem-se diante dele os habitantes do deserto, e os seus inimigos lambam o pó.  Paguem-lhe tributos os reis de Társis e das ilhas; os reis de Sabá e de Sebá lhe ofereçam presentes. E todos os reis se prostrem perante ele; todas as nações o sirvam.” (Salmos  72.8-11 ARA).
            Deus mostrou a Daniel um esboço da história, no qual uma grande estatua (representa os quatro impérios da Babilônia, Medo-Persa, Grécia e Roma) é derrubada e esmagada por uma rocha; “Mas a pedra que feriu a estátua se tornou em grande montanha, que encheu toda a terra”. (Daniel 2.35 ARA). O significado desta visão é a restauração do Éden sob o Rei, como explicou Daniel: “Mas, nos dias destes reis, o Deus do céu suscitará um reino que não será jamais destruído; este reino não passará a outro povo; esmiuçará e consumirá todos estes reinos, mas ele mesmo subsistirá para sempre,” (Daniel 2.44 ARA). Cristo, o Segundo Adão, levará a cabo a tarefa designada ao primeiro Adão, fazendo que o Monte Santo cresça e alcance o mundo inteiro.
Ascendendo ao Trono
            Em uma visão posterior, Daniel previu realmente a entronização de Cristo como o Rei prometido:
Eu estava olhando nas minhas visões da noite, e eis que vinha com as nuvens do céu um como o Filho do Homem, e dirigiu-se ao Ancião de Dias, e o fizeram chegar até ele.
Foi-lhe dado domínio, e glória, e o reino, para que os povos, nações e homens de todas as línguas o servissem; o seu domínio é domínio eterno, que não passará, e o seu reino jamais será destruído. (Daniel 7.13-14 ARA)
            Na atualidade, se supõe comumente que este texto descreve a Segunda Vinda e assim, que o reino de Cristo (chamado geralmente de o milênio) começa somente depois de seu regresso. Claro que isto passa por cima do fato de que Daniel já havia profetizado que o reino começaria nos dias do Império Romano. Porém, nota-se exatamente o que Daniel disse: Se vê a Cristo aproximando-se, não distanciando-se! Ele o Filho do homem vai até ao Ancião de Dias, não em direção oposta a ele! Não está descendo nas nuvens para a terra, mas ascendendo nas nuvens até seu Pai! Daniel não estava predizendo a segunda vinda de Cristo, mas estava muito bem descrevendo o clímax do primeiro advento, no qual, depois de expiar os pecados e derrotar a morte e Satanás, o Senhor ascendeu nas nuvens do céu para sentar-se em seu glorioso trono à direita do Pai. Vale apenas notar também que Daniel usou o termo Filho do homem, a expressão que Jesus adotou mais tarde para descrever a si mesmo. Claramente, devemos entender a expressão Filho do homem simplesmente como filho de Adão – em outras palavras, o segundo Adão. Cristo veio como o Filho do homem, o segundo homem (1ª Coríntios 15.47), para levar a cabo a tarefa que havia sido confiada ao primeiro homem. Veio para ser o Rei.
            Esta é a constante mensagem dos evangelhos. O relato de Mateus sobre o Natal registra a história dos magos do oriente que chegaram a adorar ao Rei, e o zeloso intento de Herodes de destruir-lhe por considerá-lo rival de seu próprio domínio injusto. Em segundo lugar, Cristo escapa e é Herodes quem morre (Mateus 2). Imediatamente, a história de Mateus salta trinta anos a frente para sublinhar o que quer dizer:
“Naqueles dias, apareceu João Batista pregando no deserto da Judéia e dizia: Arrependei-vos, porque está próximo o reino dos céus.” (Mateus 3.1-2 ARA).
            Logo, Mateus se volta até o ministério de Jesus dando-nos um resumo da mensagem básica de Cristo para Israel: Arrependei-vos, porque o Reino de Deus está próximo”(Mateus 4.17). “Percorria Jesus toda a Galiléia, ensinando nas sinagogas, pregando o evangelho do reino e curando toda sorte de doenças e enfermidades entre o povo”. (Mateus 4.23 ARA). Uma simples olhada em uma concordância revelará quão central era o evangelho do reino para o programa de Jesus. E nota-se bem que o reino não era algum milênio distante de milhares de anos no futuro, depois da Segunda Vinda. Jesus anunciou: “O tempo está cumprido, e o reino de Deus está próximo; arrependei-vos e crede no evangelho”. (Marcos. 1.15 ARA). Jesus disse claramente a Israel que se arrependesse agora, porque o reino viria imediatamente.  O reino estava próximo. Jesus o estava introduzindo diante dos próprios olhos deles. (Veja-se: Mateus 12.28; Lucas 10.9-11; 17.21), e pronto ascenderia ao Pai para sentar-se no trono do reino. Por isso, disse aos seus discípulos: “Em verdade vos digo que alguns há, dos que aqui se encontram, que de maneira nenhuma passarão pela morte até que vejam vir o Filho do Homem no seu reino. (Mateus. 16.28 ARA).
            Jesus estava certo ou equivocado? Nos termos de alguns mestres modernos, Jesus estava errado. E isto não é um pequeno erro de cálculo: Jesus erro o alvo por milhares de anos! Podemos confiar nele como Senhor e Salvador, e todavia sustentar que ele estava equivocado, ou que de alguma forma sua profecia havia saído dos trilhos? Jesus não era somente um homem, como o primeiro Adão. É Deus, o Senhor dos céus e da terra; e si se dispõe a trazer o reino, pode algo deter-lhe? Nem sequer a crucificação foi um contratempo, porque era um aspecto crucial de seu plano. Por isso disse: “porque eu dou a minha vida para a reassumir. Ninguém a tira de mim; pelo contrário, eu espontaneamente a dou. Tenho autoridade para a entregar e também para reavê-la”. (João.10.17-18 ARA). Temos que crer no que Jesus disse: Durante a vida dos que o escutavam, o veriam em seu trono. E isso foi exatamente o que fez, culminando em sua ascensão a seu trono celestial.
            Mateus disse que a entrada de Jesus em Jerusalém cumpriu especificamente a profecia veterotestamentária da inauguração do reino:
Alegra-te muito, ó filha de Sião; exulta, ó filha de Jerusalém: eis aí te vem o teu Rei, justo e salvador, humilde, montado em jumento, num jumentinho, cria de jumenta. Destruirei os carros de Efraim e os cavalos de Jerusalém, e o arco de guerra será destruído. Ele anunciará paz às nações; o seu domínio se estenderá de mar a mar e desde o Eufrates até às extremidades da terra.
 (Zacarias 9.9-10 ARA; Veja-se Mateus 21.15)
            O apóstolo Pedro entendia que o significado da ascensão era a entronização de Cristo no céu, citando uma profecia do rei Davi,  Pedro disse:
Sendo, pois, profeta e sabendo que Deus lhe havia jurado que um dos seus descendentes se assentaria no seu trono, prevendo isto, referiu-se à ressurreição de Cristo, que nem foi deixado na morte, nem o seu corpo experimentou corrupção. A este Jesus Deus ressuscitou, do que todos nós somos testemunhas.Exaltado, pois, à destra de Deus, tendo recebido do Pai a promessa do Espírito Santo, derramou isto que vedes e ouvis. Porque Davi não subiu aos céus, mas ele mesmo declara: Disse o Senhor ao meu Senhor: Assenta-te à minha direita, até que eu ponha os teus inimigos por estrado dos teus pés. Esteja absolutamente certa, pois, toda a casa de Israel de que a este Jesus, que vós crucificastes, Deus o fez Senhor e Cristo.
 (Atos 2.30-36 ARA) [75]
            É crucial que entendamos a interpretação da própria Bíblia acerca do trono de Cristo. segundo o inspirado apóstolo Pedro, a profecia de  Davi sobre Cristo sentado em um trono não era uma profecia de algum trono terreno em Jerusalém (como alguns insistem erroneamente). Davi estava profetizando acerca do trono de Cristo no céu. É a entronização celestial a que o rei Davi predisse, assim disse Pedro ao seu auditório no dia de Pentecoste. Desde seu trono no céu, Cristo já está reinando no mundo.
            O apóstolo Paulo estava de acordo e escreveu assim sobre a ascensão de Cristo: Deus:
fazendo-o sentar à sua direita nos lugares celestiais,  acima de todo principado, e potestade, e poder, e domínio, e de todo nome que se possa referir não só no presente século, mas também no vindouro E pôs todas as coisas debaixo dos pés e, para ser o cabeça sobre todas as coisas, o deu à igreja,  (Efésios 1.20-22 ARA)
            Pois, bem, se Cristo está sentado agora sobre todo principado e autoridade e poder e domínio, se todas as coisas estão agora sob seus pés, por que alguns cristãos estão esperando que o reino de Cristo comece? Segundo Paulo, Deus “nos libertou do império das trevas, e nos transladou para o reino do filho do seu amor”. ( Colossenses 1. 13). A Bíblia disse que o reino já chegou; alguns teólogos modernos dizem que não chegou. Há na realidade alguma dúvida sobre em quem devemos crer?
A Prisão de Satanás.
            A promessa original do evangelho estava contida na maldição de Deus sobre a serpente, de que a semente da mulher lhe esmagaria a cabeça (Gênesis 3.15). Em consequência, quando Jesus veio, começou imediatamente a obter vitórias sobre Satanás e suas legiões demoníacas, travando em combate somente ele e expulsando-os efetivamente da terra, junto com a enfermidade e a morte. Houve uma guerra acirrada durante o ministério de Cristo, na qual Satanás perdia terreno continuamente e fugia para esconder-se. Depois de observar a seus discípulos em uma missão que haviam conseguido êxito, Jesus se regozijou: “Eu via Satanás caindo do céu como um relâmpago. Eis aí vos dei autoridade para pisardes serpentes e escorpiões e sobre todo o poder do inimigo, e nada, absolutamente, vos causará dano” (Lucas 10.18-19 ARA). Jesus explicou suas vitórias sobre os demônios dizendo a seus ouvintes que “é chegado o reino de Deus sobre vós”. E continuou: “Ou como pode alguém entrar na casa do valente e roubar-lhe os bens sem primeiro amarrá-lo? E, então, lhe saqueará a casa.” (Mateus 12.28-29 ARA). Era exatamente isso que Jesus estava fazendo no mundo. Estava amarrando a Satanás, o “valente”, para saquear sua casa, para resgatar as pessoas das mãos do diabo.
            A derrota definitiva de Satanás ocorreu na morte e ressurreição de Cristo. Várias vezes, os apóstolos asseguraram aos primeiros cristãos do fato da vitória sobre o diabo. Disse Paulo que, por meio da obra consumada, o Senhor Jesus “despojando os principados e as potestades, publicamente os expôs ao desprezo, triunfando deles na cruz.” (Colossenses 2.15 ARA). O Novo Testamento ensina inquestionavelmente que, ao romper cristo as algemas da morte, Satanás foi deixado impotente (Hebreus 2.14), João Escreveu  que “para isto apareceu o Filho de Deus, para desfazer as obras do diabo” (1ª João 3.8). Novamente, devemos notar que isto está no tempo passado. É um fato consumado. Esta não uma profecia acerca da Segunda Vinda. É uma afirmação sobre o primeiro advento de Cristo. Cristo veio para amarrar e desarmar a Satanás, deixá-lo impotente, destruir suas obras, e estabelecer seu próprio reino como Rei universal, como havia sido o propósito de Deus desde o começo. Segundo a Bíblia, Cristo cumpriu efetivamente o que se havia proposto; a Escritura considera a Satanás um inimigo derrotado, que tem que fugir quando os cristãos se lhe opõe que não pode resistir o ataque vitorioso do exército de Cristo. As portas de sua cidade estão condenadas a derrubar-se diante dos inexoráveis ataques da igreja (Mateus 16.18).
O Crescimento do Reino.
            Neste ponto, alguns objetarão: “Se Jesus é Rei agora, por que não converte as nações? Por que há tanta impiedade? Por que não tudo perfeito?” Em primeiro lugar, não há nenhum “se” condicional no assunto. Jesus é o rei, e seu reino já chegou. A Bíblia diz assim. Em segundo lugar, as coisas nunca serão “perfeitas” antes do juízo final; e até o milênio descrito por certos escritores populares estão longe de ser perfeito (na realidade, em si mesmo é muito pior, porque ensinam que as nações nunca se converterão verdadeiramente, mas que somente fingiram haver-se se convertido enquanto esperam uma oportunidade para rebelar-se).
            Terceiro, ainda que o reino foi estabelecido definitivamente na obra consumada de Cristo, é estabelecido progressivamente*durante a história (até que seja estabelecido finalmente no dia final). Em uma parte, a Bíblia ensina que Cristo Jesus está agora reinando sobre as nações com vara de férreo; agora está sentado com poder sobre todos os outros poderes nos céus e na terra, possuindo toda  autoridade. De outro lado, a Bíblia também ensina que o reino se desenvolve progressivamente, fazendo-se mais forte  e mais poderoso com o passar do tempo. A mesma cara aos Efésios que nos fala do governo absoluto de Cristo sobre a criação (1.20-22), assegurando-nos que estamos reinando com ele (2.6), também nos ordena a pormos a armadura para combater contra o inimigo (6.10-17). Não há nenhuma contradição aqui – só dois aspectos da mesma realidade. E o fato de que Jesus está agora reinando como rei de reis é precisamente a razão de porque temos confiança na vitória em nosso conflito com o mal. Podemos experimentar o triunfo progressivo agora, porque Cristo Jesus triunfou definitivamente sobre Satanás em sua vida,  morte, ressurreição e ascensão.
            Jesus contou duas parábolas que ilustram o crescimento do reino. Mateus:
Outra parábola lhes propôs, dizendo: O reino dos céus é semelhante a um grão de mostarda, que um homem tomou e plantou no seu campo; o qual é, na verdade, a menor de todas as sementes, e, crescida, é maior do que as hortaliças, e se faz árvore, de modo que as aves do céu vêm aninhar-se nos seus ramos. Disse-lhes outra parábola: O reino dos céus é semelhante ao fermento que uma mulher tomou e escondeu em três medidas de farinha, até ficar tudo levedado. (Mateus  13.31-33 ARA)
            O reino foi estabelecido quando Cristo veio. Porém não tem alcançado seu pleno desenvolvimento. Como um grão de mostarda, começou sendo pequeno, porém crescerá até ficar bem grande (da mesma forma que a rocha que Daniel viu e se tornou monte que preencheu toda a terra). O reino crescerá em tamanho, estendendo-se a todas as partes, até que o conhecimento de Deus cubra toda a terra, como as águas cobrem o mar. O crescimento do reino será extensivo.
            Porém, o reino também crescerá intensivamente. Como o fermento no pão, transformará o mundo, tão seguramente como transforma as vidas individuais. Cristo tem plantado no mundo seu evangelho, poder de Deus para a salvação. Como o fermento, o poder do reino continuará operando “até que tudo esteja levedado”.
            Depois de examinar esta parábola, você se poderia perguntar como poderia alguém negar uma escatologia do domínio. Como pode alguém ignorar a força deste versículo? Aqui é como: o derrotista simplesmente explica que a “levedura” não é o reino, mas uma representação de como as heresias maléficas que são plantadas na igreja pelo diabo! Incrivelmente, seu caso é tão desesperado que recorrerá a jogos de cartas, convertendo uma promessa da vitória do reino em uma promessa da derrota da igreja. Nota-se bem que tudo está levedado; o versículo ensina a vitória total, de um lado ou de outro.
            Por conseguinte, segundo Jesus, que lado ganhará? Contrariamente aos pessimistas, Jesus não disse que o reino é como a massa, na qual alguém introduz sorrateiramente o mau fermento. Jesus disse que o reino é como o fermento. O reino começou pequeno, e seu crescimento frequentemente tem sido desapercebido e algumas vezes virtualmente invisível, porém continua fermentando e transformando o mundo. Onde estava o cristianismo há 200 anos? Consistia de mero punhado de pessoas que haviam sido comissionadas para fazer discípulos às nações – um pequeno grupo que seria perseguido por seus próprios compatriotas e ao que se oporia o exército do Império mais poderoso da história. Que possibilidades lhe haveriam dado de que sobreviveriam? Contudo, a igreja saiu vitoriosa do conflito, ganhadora por uma ampla vantagem; Roma e Jerusalém não passaram do ponto de partida. Os últimos vinte séculos têm sido testemunhas do progresso que só poderia negar os cegos voluntários. Tem-se estendido por todas as partes o fermento do evangelho? Claro que não. Ainda não. Mas o fará. Deus nos tem predestinado para a vitória.     




* Nota do Tradutor: vale salientar que a posição do David Chilton é Pós-milenista  que difere do tradutor da presente obra.

terça-feira, 21 de maio de 2013

O GOVERNO BÍBLICO DE IGREJA


O GOVERNO BÍBLICO DA IGREJA
Atos 20.28
Rev. João Ricardo Ferreira de França.
INTRODUÇÃO:
            Em nossos dias existe uma crise de identidade na Igreja evangélica atual. Crise do ponto de vista doutrinária, os evangélicos de modo geral não sabem mais no que creem, não existe mais a preocupação com um credo, ou com uma confessionalidade estrita e clara.
            A erosão da fé tem sido presente em nosso tempo. A negação da suficiência da Palavra de Deus é patente em nossos dias, e esta negação, não está vinculada a questão do pentecostalismo somente, mas também a questão do governo eclesiástico da igreja; pois, se tem aceitado que este tema é um campo periférico da teologia e que não devemos debater ou contender sobre este valioso assunto.
            Um escritor dá-nos uma alerta crucial sobre isto, ao dizer:
É muito comum os crentes professos fazerem distinção entre o essencial  e o não essecial em religião e inferir que, se algum fato ou doutrina pertence exatamente a esta última classe, deve ser uma questão de pouca importância, e pode na prática, ser seguramente relegada a um plano secundário. A maioria das pessoas tira conclusões sem um exame prévio; não querem pagar o preço de pensar, pesquisar, de raciocinar sobre nada e um dos expedientes mais frequentes adotados por elas para se livrarem da responsabilidade de usar a mente e desprezar algum fato que se julgue desagradável é dizer: “Esse problema não é essencial para salvação; portanto, não precisamos nos preocupar muito com isso”.[1]
            As palavras deste pastor presbiteriano nos alerta para um fato importante que é a marginalização de temas teológicos que são fundamentais para a igreja de Cristo, e assim, a negligência sobre a temática do governo da Igreja de Cristo torna-se mais evidente. Concentramo-nos em temas como: Revelação, Expiação, Justificação, Regeneração; todavia, quando se vai tratar de governo eclesiástico achamos algo se proveito, e somos até acusados de dogmatizadores quando somos enfáticos neste assunto, mas uma vez Witherow nos alerta dizendo “se todas as outras verdades reveladas são irrelevantes porque não são essenciais para a salvação, o resultado é que o que o que se está sendo negado é a importância da própria Palavra de Deus”.[2]
            Quando se omite e julga-se irrelevante tais assuntos ataca-se a doutrina da Suficiência das Escrituras. O Sola Scriptura e o Tota Scriptura  são desprezados nas considerações teológicas sobre esta temática. Por isso, o nosso estudo aqui visa apresentar a importância, a atualidade e a necessidade deste tema importantíssimo na vida da Igreja de Cristo.
            Sabemos que “o tema Governo Eclesiástico não sugere nada atraente”[3]. Isto devido a falta de literatura, de interesse e de disponibilidade dos pastores em ler, produzir e ensinar sobre a eclesiologia. Alguém poderia perguntar: “por que é importante estudar este assunto?” A resposta está no fato de que o “ministério e a forma de governo constituem um dom de Deus para a igreja”[4]. E esta é a razão suficiente para estudarmos a natureza do governo bíblico da igreja.
            Tudo isso nos leva para necessidade da Igreja em nossa vida, estamos cientes de que existe em nossos dias protestos contra a Igreja e que vivemos tempos no qual as pessoas dizem “‘queremos Deus, não uma instituição’”[5]; embora tal declaração seja preocupante para nós o nosso estudo não se concentrará nesta problemática, mas focalizará toda a atenção na questão do governo bíblico da Igreja de Cristo.


 I – A BÍBLIA E OS OFICIAIS GOVERNANTES DA IGREJA

            A discussão sobre a eclesiologia começa quanto se procura responder a seguinte questão: quem deve governar a Igreja de Cristo? A resposta que damos a esta pergunta apresentará as nossas concepções sobre o governo bíblico da Igreja. Se dissermos que a Igreja deve ser governada por um pastor-presidente, ou por um único homem estaremos adotando uma postura de governo conhecida como Episcopal.
            A estrutura de governo Episcopal é adotada pela Igreja Romana onde os sistema de bispo é introduzido, isto porque para eles o supremo bispo da Igreja é o Papa! Mas, este sistema não está presente apenas na Igreja Romana, ela se encontra em muitas igrejas evangélicas e protestantes. Onde se adota a figura do bispo, apóstolo, e até do pastor presidente.
            Agora, se a nossa resposta for a de que o povo governa junto o sistema ai é o congregacional. No sistema congregacional “todos tomam parte das decisões; e os erros também são mais frequentes, pois, nem todos estão preparados para atuar em todos os níveis de decisão”[6]. Há um adágio popular que diz “casa onde todo mundo manda, ninguém manda”, está é a implicação lógica do congregacionalismo. As igrejas que sustentam este sistema são as Igrejas Independentes ou Congregacionais e as Igrejas Batistas.
            Uma terceira reposta tem sido dada a respeito de quem deve governar a igreja de Cristo? A resposta é que alguns governam sobre todos como representantes. O sistema é conhecido como representativo, ou sistema presbiteriano de governo. As Igrejas Reformadas e Presbiterianas sustentam este sistema de governo.
            Neste sistema os membros elegem os seus oficiais que são representantes pactuais. Estes oficiais eleitos formam seus concílios, que são assembleias formadas por pastores e presbíteros. É a defesa deste sistema que o nosso estudo procura fazer.

1.1 – O Governo Por meio dos Presbíteros.

1.1.1 – Definição do termo Presbítero:

            No Novo Testamento os oficiais regentes da Igreja são chamados de presbíteros. Antes de falarmos sobre a importância e o papel deles na vida da Igreja precisamos esclarecer o que o termo significa.
            O nome presbiterianismo é derivado da palavra grega Presbyteros que significa ancião ou presbítero. Em Atos 20.17 vemos que Paulo chama os presbíteros “πρεσβυτέρους” [presbyterous]. O vocábulo indica aquele que tem experiência. Como alguém já colocou que este termo indica que o presbítero é “um homem menos moço, com mais idade do que o comum dos de um grupo ou congregação.Idade, no sentido de vida mental, vida moral e vida espiritual, experiência, mais mesmo, do que vida no tempo”.[7]
1.1.2 – O ofício de Presbítero no Antigo e Novo Testamento.
            No Antigo Testamento encontramos os presbíteros como líderes do povo pactual. Moisés quando é convocado por Deus para libertar o povo se depara com a realidade presente dos presbíteros / anciões do povo de Israel naquele tempo. Em Êxodo 3.16; em Números 11.16,24-25 temos a mesma tônica presente. Por todo, o Antigo Testamento se verá os anciões/ presbíteros presente na vida religiosa e civil do povo de Israel no Antigo Testamento. [Dt.2119; Êx 24.1; Lv.4.15; Jz.8.14]
            No Novo Testamento encontramos uma classe variada de líderes. “os anciões”, “governadores” e “principais” ou “chefes da sinagoga”[8] sabemos que durante o tempo de Cristo que a liderança judaica era corrupta a mesma não deixou o oficio de presbítero desaparecer.[9] [ Mt.15.2; Mc. 7.3; Jo.3.1; 7.26,48; Mc.5.22; Lc.8.41]. Este governo tem suas raízes desde o Antigo Testamento por isso o Governo Presbiteriano é essencialmente bíblico.

1.2 – Os Presbíteros: Os Oficiais Qualificados para governarem a Igreja de Cristo.

            Nesses dias de imediatismo tendemos a escolher como nossos líderes pessoas não qualificadas para tamanha responsabilidade; muitas das nossas escolhas, neste particular, estão motivadas pela simpatia, amizade, coleguismo ou por ser alguém que sabe falar bem, e assim, julgamos ser necessário para ocupar o lugar de líder na igreja.
            Outro ponto é que muitas pessoas pensam que todo e qualquer homem pode ser líder da Igreja de Cristo. Kevin Reed nos diz que não “basta haver homens meramente nomeados com o título de presbíteros. Eles devem antes ser qualificados para governar, como demonstram os critérios das Escrituras para os oficiais.”[10] Desde o Antigo Testamento os líderes eclesiásticos deveriam ser qualificados para ocupar tal ofício. Tinha que ser:
a)      Sábios e Experientes (Dt.1.13)
b)      Homens íntegros e verdadeiros (Êx 18.21).
            No Novo Testamento essas exigências ficaram mais intensas. Essa cobrança e intensidade se vê presente nas cartas de Paulo ao jovem pastor Timóteo e a Tito. São qualificações indispensáveis para os presbíteros da Igreja de Cristo Jesus. O apóstolo apresenta três áreas importantes na vida de um homem qualificado para o presbiterato, estas qualificações precisam ser enfatizadas para que a igreja não sofra no futuro.

1.2.1 -  Devem ser homens qualificados na vida moral.

            O texto de 1ª Timóteo assegura que aquele que deseja ser presbítero é “necessário” (1ª Tim.3.2). Ele deve ser um exemplo no caráter, pois a qualificação é que seja alguém:

            a) Irrepreensível:

Ele nãoi deve ser alguém que vivemos corrigindo por suas falhas de caráter ou de comportamento é isso que o grego exige daquele que se diz qualificado para tal ofício  seja alguém livre de reprovação “ἀνεπίληπτον”[anepilepton].

            b) Possuir uma relação monogâmica:

O ser “esposo de uma só mulher”. Aponta para a realidade que naquela igreja havia muitos homens que vieram do paganismo com suas mulheres [ eram membros com mais de uma esposa ], mas Paulo alerta a Igreja que o oficial da igreja, o líder deve ser um exemplo de marido fiel para com sua esposa, tendo uma relação monogâmica.

      c) Deve possuir qualidades que o notabilize como agente da graça de Deus:

      “temperante, sóbrio, modesto, hospitaleiro,aqui o apóstolo Paulo mostra que o presbítero deve ser alguém pacificador, alguém que não gosta de intrigas – ele usa a ideia de ser “temperante”; outra qualidade expressa é a da sobriedade – alguém que não dominado pelo vinho. Alguém modesto que não ostenta ser alguma coisa, alguém que procura parecer, e por fim, deve ser hospitaleiro. Um presbítero deve ser acolhedor, deve receber em casa, e receber bem os membros, viajantes e os que carecem de acolhida, pois, se assim não for, não deve ser eleito para o oficio de presbítero.

1.2.2 – Devem Possuir conhecimento doutrinário:

            O segundo requisito para ser oficial da Igreja de Cristo é que este homem deve ser “apto para ensinar” (1ª Timóteo 3.2) e para “admoestar com a sã doutrina como para convencer os contradizentes”(Tito 1.9). O homem  que é chamado para exercer o dom do presbiterato na Igreja deve ser acima de tudo um teólogo, um homem com uma mente aguçada em temas teológicos; deve ser alguém que ama ler livros, estudar teologia. O presbítero tem por obrigação refutar as heresias e os falsos ensinos.

1.2.3 – Devem possuir uma família estável:

            O apóstolo Paulo 1ª Timóteo 3.5 aquele que almeja a obra do episcopado deve possuir uma família modelo; uma família que ele governe bem para que possa saber como lidar com a Igreja de Deus em questões cruciais. Ele deve saber conduzir sua família no reino de Deus. Pois, um “homem que falha em influenciar piedosamente sua família, não está apto ao cargo público de oficial da igreja”[11].
            Este oficial não pode ser um neófito na fé (1ª Timóteo 3.6) porque o tempo e a experiência devem ser os aliados daqueles que são chamados para o santo ofício do presbiterato. A igreja deve procurar essas qualidades nos seus futuros oficias para que não escolham o candidato errado para ocupar o oficio eclesiástico da Igreja (1ª Timóteo 5.22)

II – A BÍBLIA E A PLURALIDADE DE PRESBÍTEROS NO GOVERNO ECLESIÁSTICO.

            O segundo aspecto de nosso estudo tem haver com a seguinte questão: Quantos presbíteros deve haver em cada congregação? Outra pergunta importante é sobre a relação entre o pastor e presbítero? O Pastor é maior que o presbítero? Essas são perguntas pertinentes ao nosso assunto.

2.1 – A Pluralidade de Presbíteros.


            No sistema presbiteriano é caracterizado pela pluralidade de presbíteros”[12]; esta pluralidade é fundamentada nas Escrituras Sagradas, pois, é-nos ensinado na Palavra de Deus que em cada Igreja formada por Paulo deveria haver mais de um presbítero.
            No livro de Atos de imediato descobrimos a figura do presbítero eleito pela comunidade cristã (Atos 14.23). No texto grego temos a palavra “Χειροτονήσαντες”[cheirotonesantes] que tem os sentido de fazer uma escolha pública levando a mão. Sem contar que ainda em Atos 20.17 o Apóstolo Paulo havia chamado os presbíteros [nota-se que no plural] para que os mesmos se encarregassem de seus deveres de supervisores e pastores da igreja de Cristo conforme vemos em Atos 20.28.
            Na sua Carta a Tito Paulo designa-o para que estabelecesse presbíteros [plural] em cada cidade. [Tito 1.5]; então, nas igrejas deve haver mais de um presbítero para governar a Igreja de Cristo. 

2.2 – As distinções entre os Presbíteros.

            Outra questão que precisa ser considerada diz respeito as distinções dentro da classe de oficiais chamada de presbíteros.
Dentro dessa classe de oficiais, existem duas ordens (1Tm 5.17). Aos presbíteros regentes é confiada, especificamente a tarefa de administrar a ordem e a disciplina em uma igreja específica; além disso, eles são conclamados a ‘cultivar zelosamente sua própria aptidão para ensinar a Bíblia e devem aproveitar cada oportunidade de assim fazer (BCO 8-90). Os Presbíteros Docentes são aqueles que, além da responsabilidade de administrar a igreja, têm ainda à função de alimentar o rebanho pela leitura, explanação  e pregação da Palavra de Deus e a ministração dos sacramentos (BCO 8-50). Os presbíteros docentes às vezes são chamados ministros da Palavra. Os presbíteros docentes, como também os regentes, são duas ordens dentro da mesma classe de oficiais; ambos possuem ‘a mesma autoridade e elegibilidade para atuar nos concílios da igreja (BCO 8-9)[13] 
            Calvino comentando o texto de 1ª Timóteo 5.17 nos diz o seguinte:
À luz desta passagem podemos inferir que há dois tipos de presbíteros, visto que nem todos são ordenados para a docência. O significado cristalino das palavras está no fato de que havia alguns que governavam bem e de forma honrosa, no entanto, não eram detentores da função pedagógica. Elegiam-se homens solícitos e bem preparados, os quais, juntamente como os pastores num concílio comum, e investidos de autoridade delegada pela Igreja, se destinavam a ministrar a disciplina e a agir como censores com vistas à disciplina moral.[14]
            A distinção dentro do presbiterado tem sido reconhecida pela igreja de Cristo desde muito cedo, o presbítero docente é também conhecido como Pastor, ministro da palavra.

2.3 – As Distinções entre os Presbíteros e Pregação da Palavra:

            Diante disso tudo surge uma pergunta: se há duas classes de presbíteros na Igreja de Cristo quem deve pregar a Palavra? O presbítero regente pode pregar a Palavra à Congregação?
2.3.1 – A Posição dos Símbolos de Fé do período da Reforma Protestante:
            Na Reforma Protestante se debateu muito sobre isso, e os teólogos reformados apresentaram uma resposta sobre o tema em seus símbolos de Fé.
2.3.1.1 - Confissão Helvética (1536):
“[...] que os mistérios das Escrituras sejam diariamente expostos e explicados por ministros qualificados [...]”
            2.3.1.2- Artigos de Lausanne (1536 – Suiça):
“Dita Igreja não reconhece outro ministro exceto aquele que Prega e administra os sacramentos
            2.3.1.3- A Confissão de Genebra (1536 – escrita por João Calvino):
Nós não reconhecemos a outros pastores na Igreja senão aos pastores fiéis da Palavra de Deus, que alimentam as ovelhas de Cristo [...]” “Nós cremos que os Ministros da Palavra de Deus e os Presbíteros e Diáconos, devem ser eleitos aos seus respectivos ofícios mediante uma eleição legal da Igreja [...]”          
            2.3.1.4- Confissão de Fé Francesa (1559):
“[...] nós cremos que a ordem da Igreja, estabelecida por sua autoridade, deve ser sagrada e inviolável, e que, portanto, a Igreja não pode existir sem pastores para a instrução, a quem devemos respeitar e escutar reverentemente, quando eles tem sido chamados de maneira apropriada e exercem seu ofício fielmente”.
            Todas as confissões aqui de forma incontestável estabelecem que o pastor é o único ministro da Palavra que possui a prerrogativa de proclamação como de ministração dos sacramentos [ Batismo e Eucaristia].

2.4  – A Posição Presbiteriana: O Catecismo Maior de Westminster [1643-1648]:

PERGUNTA 158: Por quem deve ser pregada a Palavra de Deus?
RESPOSTA: A Palavra de Deus deve ser pregada somente pelos que foram suficientemente dotados e devidamente aprovados e chamados para tal ofício.
            O nosso catecismo reconhece que apenas os Ministros da Palavra devem pregar. O ponto fundamental aqui é que muitas de nossas igrejas fazem escalas da pregação para que os presbíteros regentes preguem, um diácono, um seminarista e assim por diante, mas os padrões de Westminster, de modo particular, o catecismo Maior reconhece que a Palavra de Deus deve ser pregada SOMENTE  PELOS QUE FORAM suficientemente dotados e devidamente aprovados e chamados para tal ofício.
            Isso tem gerado muito debate nos círculos evangélicos da atualidade – a publicações de livros que incentivam a pregação leiga tem abarrotado as livrarias de modo geral. Mas, precisamos dizer que a pregação leiga não é bíblica, não tem apoio da tradição reformada, e não é autorizada pelos padrões confessionais.
            David Martyn Lloyd-Jones nos lembra algo interessante sobre este assunto:
[...] Quem deve realizar a Pregação? O primeiro princípio que gostaria de afirmar é que nem todos os crentes são destinados  a fazer isso, nem todos os homens crentes devem pregar, e de maneira alguma as mulheres! Noutras palavras, precisamos considerar o que se chama ‘pregação leiga’. Isto já vem sendo praticado de modo bastante comum há cem anos ou mais. Antes, era uma prática comparativamente rara, mas hoje é muito comum. Seria interessante examinamos a história dessa prática, mas o tempo impede de fazê-lo. Novamente, o mais interessante a ser observado é que esta mudança resultou de causas teológicas. Foi a mudança na teologia do século passado, de uma atitude reformada e calvinista para uma postura essencialmente arminiana, que provocou o aumento da pregação de leigos. A explicação dessa causa e efeito é que, em última análise, o arminianismo é não-teológico. Eis porque a maioria das denominações evangélicas  da atualidade são igualmente não-teológicas. Sendo esse o caso, não deve nos surpreender o fato de que predominem em nossos dias o ponto de vista de que a pregação está aberta a todo homem e posteriormente, a qualquer mulher. Minha asserção é que esta é uma perspectiva antibíblica sobre a pregação.[15] 
            A pregação leiga – homem da igreja, presbítero regente, diácono, seminarista – é fruto da perspectiva arminiana que deseja dar aos ‘novos convertidos o que fazer na igreja’, e assim, ignorando completamente a noção de vocação para o ministério da Palavra.
            O dr. Vos comentando a pergunta 158 do Catecismo Maior de Westminster lembra-nos que:
Quem não for ministro ordenado ou licenciado pode testemunhar de Cristo em particular ou em público, conforme a oportunidade o permita, mas a pregação pública oficial da Palavra na Igreja deve ser feita apenas por aqueles devidamente separados para esta obra. Claro está que a pregação da Palavra é uma obra de importância muito grande. São necessárias as qualificações apropriadas para que seja feita de maneira adequada. Há qualificações espirituais, intelectuais e educacionais sobre as quais se deve insistir para que a igreja tenha um ministério adequado. [16]
            Esta posição confessional da Igreja é a posição histórica do presbiterianismo, o Dr. Roger Smalling responde a questão do catecismo Maior de Westminster sob os seguintes termos:
            Aparece uma ligeira ambigüidade nesta declaração. Tradicionalmente, se tem entendido que o Catecismo Maior de Westminster delega aos Presbíteros Docentes ordenados, ainda que, o termo Pastor ou Ministro não se use aqui. Mas, depois disto tudo, que aconteceria se um Presbítero Regente pudesse pregar melhor que um Presbítero Docente qualquer? A Assembleia da PCA[17] de 1979 responde:
Recomendação Nº 4:
A Assembleia Geral reafirma a posição Presbiteriana histórica conforme expressa no Catecismo Maior em sua pergunta 158, que ninguém deve pregar o Evangelho senão aqueles que são chamados e dotados por Deus; e que, por conseguinte, somente aqueles homens que são apropriadamente ordenados ou licenciados podem pregar nos púlpitos da PCA; e que aos Presbíteros Regentes se lhes permite e anima a renovar a prática histórica de exortar ao povo de Deus. (Adotado, p.457-458).
Esta recomendação uni-se com a recomendação de Número 5 que trata da relação do Pastor com o Conselho. Disto nós vemos que a PCA considera o púlpito como o domínio habitual do Presbítero Docente, não obstante, o Presbítero Regente pode exercer qualquer dos dons ministeriais de exortação que possua em outros domínios e circunstâncias. Na PCA, não se aceita a prática de programar dentro das agendas de pregação regulares da igreja, aqueles que não são ordenados como Presbíteros Docentes.[18]

            2.4.1  – Evidências Bíblicas para a Posição Confessional da Igreja.

            Será que existe alguma evidência Bíblica para a posição de que apenas os presbíteros docentes [ministros, pastores, bispos] proclamem a palavra de Deus no culto público?
            O ponto é que a pregação neotestamentária é marcada pelo ensino. O verbo grego didaskwdidaskô – [ensino]  é usado noventa e sete vezes no Novo Testamento. No uso deste verbo pode-se classificar o seguinte: Quando se refere à fé cristã: este verbo “didaskw” tem como sujeito o Senhor Jesus, sendo usado 48 vezes (Marcos.8.31 e 9.31); os apóstolos (dezoito vezes), o Espírito Santo (Lucas 12.12; João 14.26; 1 João 2.27); Timóteo (1 Timóteo 4.11 e 6.2); João Batista (Lucas 11.1); o cego que havia sido curado por Jesus , o qual foi acusado pelos fariseus  de estar querendo ensiná-los (João 9.34); Apolo que ensinava de modo preciso na sinagoga (Atos 18.25)[19]
            Todas as referências nas quais este verbo aparece parece indicar ofício específico do ministro da palavra.
            Agora um vocábulo que aparece na Palavra de Deus que parece ser imperativo nesta questão é o termo Arauto. No grego temos a palavra “khrux”- keryx – aponta para aquele que leva uma mensagem autorizada – um porta-voz oficial. Qual é o sentido do emprego desta palavra, era usada para descrever “o homem que é comissionado pelo seu soberano, ou pelo estado, para anunciar em voz alta alguma notícia, a fim de torná-la conhecida”.[20] 
            O uso do verbo relacionado a esta função de arauto “kerussw”- keryssô – e na leitura que fazemos do Novo Testamento nós percebemos o seguinte que o uso deste verbo se aplica:
a) Apenas a Cristo ou a alguém comissionado por Deus para o ministério da pregação ( Romanos 10.15; pois, somente estes têm a autoridade divina de se apresentar publicamente para falar em nome de Deus.
b) Nos Evangelhos apenas João Batista é assim apresentado como proclamador enviado da parte de Deus(Mt 3.1: Mc. 1.4; Lc.3.3) – sendo ele um profeta do antigo pacto.
c) Jesus é apresentado como o proclamador supremo (Mt.4.17,23;9.35;11.1; Mc1.14,38,39; Lucas 4.18,19,44.8.1)
d) Os apóstolos comissionados por Jesus  (Mt.10.7,27; Mc 3.14; 6.12; 16.15,20; Lc.9.2; 12.13.).
            Todos estes textos apresentam que os sujeitos do verbo “kerussw”- keryssô eram comissionados pelo Senhor. Paulo Anglada nos lembra:
Sempre que outras pessoas aparecem como sujeitos do verbo “kerussw”- keryssô nos evangelhos, estão desobedecendo a Cristo e, nesses casos, o conteúdo da pregação  deles é uma cura. Há três exemplos dessas pregações desautorizadas nos evangelhos. Um deles é em Marcos 1.45, quando o leproso é expressamente proibido por Jesus, saiu propalando que havia sido curado, de sorte que Jesus acabou impedido de entrar livremente na cidade. Outra ocorrência é encontrada em Marcos 5.20 e Lucas 8.39, onde se ler que o endemoninhado geresareno, libertado por Jesus, ao invés de apenas relatar o acontecido (;agge,llw [angello], em Marcos e dihge,omai [diegeomai] em Lucas) aos seus familiares (a sua casa), como Jesus havia ordenado, saiu a proclamar (“kerussw”- keryssô) como arauto o acontecimento na cidade em que vivia. O último exemplo, em Marcos 7.3, refere-se às pessoas que haviam presenciado a cura de um surdo mudo, também contrariando a ordem expressa de Jesus de não contarem (le,gousin - legousin) a ninguém o ocorrido.[21]
            Então está claro que apenas os que são chamados para a pregação – proclamação – são os ministros [presbíteros docentes] e que ninguém mais pode se intrometer neste ofício e ministério, se não for vocacionado. Mas devemos ressaltar o que diz Samuel Miller em seu livro O Presbítero Regente que: “Deve-se considerar o presbítero regente, não menos que o presbítero docente (i.e., pastor), age sob a autoridade de Cristo em tudo que legitimamente faz.”[22]

REFERÊNCIAS BÍBLICAS

1.      ANGLADA, Paulo. Introdução à Pregação Reformada – Uma investigação Histórica  sobre o Modelo Bíblico-Reformado de pregação. Ananindeua: Knox Publicações, 2005, p.33.
2.      CALVINO, João. As Pastorais. Tradução: Valter Graciano Martins. São Paulo: Parakletos, 1998, p.148.
3.      COENEN, Lothar, “khru,ssw”. In: Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento, vol.3, Ed. Lothar Coenen e Colin Brown, Tradução de Gordon Chown. São Paulo: Editora Vida Nova, 1993, p.741.
4.      DE YOUNG, Kevin & KLUCK, Ted. Porque amamos a Igreja. Tradução: Emirson Justino. São Paulo: Mundo Cristão, 2010, p.14.
5.      LEITH, John H. A Tradição Reformada – Uma Maneira de ser a Comunidade Cristã. Tradução: Eduardo Galasso Faria e Gerson Correia de Lacerda. São Paulo: Associação Evangélica Literária Pendão Real, 1997, p. 244.
6.      LLOYD-JONES, David Martyn.  Pregação e Pregadores. Tradução: João Bentes Marques. São Paulo: Editora Fiel,  2008.
7.      LUCAS, Sean Michael. O Cristão Presbisteriano – Convicções, Práticas e Histórias.Tradução: Elizabeth Gomes. São Paulo: Cultura, 2011,.
8.      MARTINS, Francisco. O Ofício de PresbíteroOrigens, história, evolução e funções. São Paulo: Casa Editora Presbiteriana, 1970.
9.      MILLER, Samuel. O Presbítero RegenteNatureza, Deveres e Qualificações. Tradução: Marcos Vasconcelos,  São Paulo: Os Puritanos, 2001.
10.  NASCIMENTO, Adão Carlos e MATOS, Alderi Souza de. O que todo Presbiteriano Inteligente deve Saber. São Paulo: Socep, 2007.
11.  REED, Kevin. Governo Bíblico de Igreja. Tradução: Adelelmo Fialho. São Paulo: Os Puritanos, 2002.
12.  SMALLING, Roger. As Distinções Entre os Presbíteros Docentes e Regentes. Tradução: João Ricardo Ferreira de França. São Raimundo Nonato – Piauí: Centro de Estudos Presbiterianos, 2011.
13.  VOS, Johannes Geerhardus. Catecismo Maior Comentado. Tradução: Marcos Vasconcelos. São Paulo: Editora Os Puritanos, 2007.
14.  WITHEROW, Thomas. A Igreja Apostólica – Que significa Isto? Tradução: Francisco Cardoso. São Paulo: Os Puritanos, 2005



[1] WITHEROW, Thomas. A Igreja Apostólica – Que significa Isto? Tradução: Francisco Cardoso. São Paulo: Os Puritanos, 2005, p.9
[2] Ibid, p. 10.
[3] REED, Kevin. Governo Bíblico de Igreja. Tradução: Adelelmo Fialho. São Paulo: Os Puritanos, 2002, p. 7.
[4] LEITH, John H. A Tradição Reformada – Uma Maneira de ser a Comunidade Cristã. Tradução: Eduardo Galasso Faria e Gerson Correia de Lacerda. São Paulo: Associação Evangélica Literária Pendão Real, 1997, p. 244.
[5] DE YOUNG, Kevin & KLUCK, Ted. Porque amamos a Igreja. Tradução: Emirson Justino. São Paulo: Mundo Cristão, 2010, p.14.
[6] NASCIMENTO, Adão Carlos e MATOS, Alderi Souza de. O que todo Presbiteriano Inteligente deve Saber. São Paulo: Socep, 2007, p.75.
[7] MARTINS, Francisco. O Ofício de PresbíteroOrigens, história, evolução e funções. São Paulo: Casa Editora Presbiteriana, 1970, p. 15.
[8] REED, Kevin. Governo Bíblico de Igreja. Tradução: Adelelmo Fialho. São Paulo: Os Puritanos, 2002, p. 14.
[9] Idem.
[10] REED, Kevin. Governo Bíblico de Igreja. Tradução: Adelelmo Fialho. São Paulo: Os Puritanos, 2002, p. 16.

[11] REED, Kevin. Governo Bíblico de Igreja. Tradução: Adelelmo Fialho. São Paulo: Os Puritanos, 2002, p. 17.
[12] Ibid, p.19.
[13] LUCAS, Sean Michael. O Cristão Presbisteriano – Convicções, Práticas e Histórias.Tradução: Elizabeth Gomes. São Paulo: Cultura, 2011, p. 141.
[14]  CALVINO, João. As Pastorais. Tradução: Valter Graciano Martins. São Paulo: Parakletos, 1998, p.148.
[15]  LLOYD-JONES, David Martyn.  Pregação e Pregadores. Tradução: João Bentes Marques. São Paulo: Editora Fiel,  2008, p.97-98
[16] VOS, Johannes Geerhardus. Catecismo Maior Comentado. Tradução: Marcos Vasconcelos. São Paulo: Editora Os Puritanos, 2007, p.508.
[17] PCA = Igreja Presbiteriana da América.
[18] SMALLING, Roger. As Distinções Entre os Presbíteros Docentes e Regentes. Tradução: João Ricardo Ferreira de França. São Raimundo Nonato – Piauí: Centro de Estudos Presbiterianos, 2011, p. 11.
[19] ANGLADA, Paulo. Introdução à Pregação Reformada – Uma investigação Histórica  sobre o Modelo Bíblico-Reformado de pregação. Ananindeua: Knox Publicações, 2005, p.33.
[20] COENEN, Lothar, “khru,ssw”. In: Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento, vol.3, Ed. Lothar Coenen e Colin Brown, Tradução de Gordon Chown. São Paulo: Editora Vida Nova, 1993, p.741.
[21] ANGLADA, Paulo. Introdução à Pregação Reformada – Uma investigação Histórica  sobre o Modelo Bíblico-Reformado de pregação. Ananindeua: Knox Publicações, 2005, p.38-39.
[22] MILLER, Samuel. O Presbítero RegenteNatureza, Deveres e Qualificações. Tradução: Marcos Vasconcelos,  São Paulo: Os Puritanos, 2001, p.14.

A CERTEZA DA GRAÇA E DA SALVAÇÃO.

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