A AUTORIA DO LIVRO DE
GÊNESIS
Prof. Rev. João Ricardo Ferreira de França.
Introdução:
O livro de Gênesis tem sido estudado
e debatido ao longo dos séculos. No
Século XIX ele foi alvo de uma gama de considerações, especulações no meio
acadêmico de forma geral. E uma das ocupações destas discussões certamente
concentra-se sobre a temática: Quem
escreveu Gênesis? O nosso estudo se ocupa desta temática.
I -
A AUTORIA MOSAICA DO LIVRO DE GÊNESIS.
A pergunta dominante entre os
eruditos em Antigo Testamento é a seguinte: Moisés
escreveu Gênesis? Dois problemas decorrem da resposta oferecida a esta
importante questão: “Negue que Moisés escreveu o Pentateuco, e alguns
suspeitarão, da sua lealdade à fé. Afirme que Moisés escreveu o Pentateuco, e
outros questionarão a sua inteligência”[1].
A questão da autoria do livro de
Gênesis está vinculada a compreensão de quem Escreveu o Pentateuco. Esse
questionamento concernente à autoria se dá porque “tecnicamente Gênesis é um
livro anônimo”[2].
Então, a busca pela autoria do livro deve-se estender pela procura do autor do
conjunto de livros que formam o Pentateuco.
A tradição da igreja tem sustentando
que Moisés seja o autor dos cinco primeiros livros da Bíblia. Um erudito em
Antigo Testamento declara:
O autor humano do Pentateuco foi Moisés,
o grande legislador de Israel. É fato que não existe nenhuma introdução,
anotação, ou declaração que a obra em
toda a sua extensão seja produto de Moisés (Cronill). Contudo, há um testemunho
convincente, de que Moisés escreveu o Pentateuco.[3]
Quais são as indicações que nos levam a crer que
Moisés seja o autor do livro de Gênesis.
1. Somos informados no Pentateuco que Moisés recebeu
revelação e registrou atos redentores:
O autor do Gênesis recebera de Deus
revelações e registrou atos redentores para a posteridade conforme somos
ensinados na totalidade dos cinco livros da Lei. E tais registros são atribuídos a Moisés:
1.1 – Ele escreveu centros acontecimentos históricos: (Êxodo 17.14; Números 33.2)
1.2 – Ele escreveu leis: (Êxodo 24.4; 34.27)
1.3 – Ele escreveu um Cântico (Deuteronômio 31.22; veja-se
Deuteronômio 32)
2. Há indicações à atividade de escrita por Moisés.
Na leitura que fazemos do Pentateuco há fortes indicações
que liga a autoria dos cinco livros a Moisés.
2.1 – Há indicação de que Moisés deixou uma tradição escrita: (Josué 1.6,7).
2.2 – Posteriormente os israelitas referem-se ao Pentateuco
como sendo a “Lei de Moisés” ( 2º Crônicas 25.4; Esdras 6.18; Neemias 13.1)
2.3 – O Novo Testamento assevera que o Pentateuco é obra de
Moisés: (Mateus
19.7; 22.24; Marcos 7.10; João 1.17; 5.46; 7.23).
Notemos que tais textos não se referem diretamente ao
Livro que estamos estudando, mas refere-se ao Pentateuco, o qual Gênesis é
considerado o primeiro capítulo. Por isso, consideramos que Gênesis tenha a sua
autoria associada a Moisés.
II - DIFICULDADES COM
A AUTORIA MOSAICA DO LIVRO DO GÊNESIS.
Apesar de toda esta
evidência a respeito da autoria do Livro ainda existem dificuldades em
relacionar Moisés como o autor da totalidade do Pentateuco. O exemplo mais
gritante é o caso de Deuteronômio 34 que trata da Morte de Moisés; será que
Moisés escreveu a sua própria morte? Alguns têm apelado para a questão de uma
revelação especial de Deus. Todavia, é provável que se trate de uma edição posterior
à morte de Moisés. Mas, será que isso invalida a questão da autoria mosaica
para o livro como um todo? Vejamos mais alguns exemplos:
2.1 – Dificuldades
Posteriores a Moisés:
1. A correção de dados Geográficos e históricos:
Gênesis
11.28,31; 15.7 – Nesta narrativa figura o nome da cidade de Abrão “Ur dos
Caldeus”. A cidade de Ur sua existência é aceita pelos eruditos, o problema
está no designativo da cidade “dos Caldeus”. Os Caldeus foi um povo que viveu
no primeiro milênio antes de Cristo; consequentemente posterior a Moisés, ou
seja, ele já estava morto.
O que ocorreu?
Alguém adicionou o designativo para localizar o leitor exatamente onde era a
cidade. E, isso foi necessário ser feito porque havia outras cidades com o nome
de Ur. Então, ao acrescentar essa designação a intenção era mostrar de qual
cidade vinha o ancestral do povo de Deus.[4]
2 . Alteração de Nomes e Lugares:
O nosso segundo exemplo vem de Gênesis 14. Nesta passagem
é-nos dito que Abrão luta com os reis para libertar ao seu sobrinho Ló. No
verso 14 aparece o nome da cidade de Dã; entretanto, o nome da cidade foi dado muito tempo depois
de Abraão conforme vemos em Juízes 17-18; tal cidade já existia no tempo do
patriarca, mas sob o nome de Laís. Fica-se claro que tal empreitada editorial
da alteração do nome da cidade era para que os leitores soubessem onde
realmente ficava esse lugar.
2.2 – Dificuldades
Anteriores a Moisés:
Devemos nos lembrar de que o Livro do Gênesis é uma
narrativa dos inícios; tais, como a criação do mundo. A pergunta a ser feita é
como Moisés tomou conhecimento dos eventos da criação anteriores a sua própria
existência? Alguns poderão dizer que tratou-se de uma revelação divina;
todavia, essa possibilidade na composição do livro não cientifica e nem salutar
para as nossas pesquisas.[5]
A posição que entendemos pelas evidências do texto de Gênesis é que Moisés
utilizou-se de outras fontes para compor o livro. Vejamos:
1. Há fórmulas Literárias que indicam o uso de fontes:
Existe na narrativa de Gênesis uma fórmula literária que
é chamada de “Toledot” que são
sentenças que começam pela expressão hebraica: “אֵ֣לֶּה תוֹלְד֧וֹת ” – ‘eleh Tholedoth”
que tem como tradução “estas são as
gerações de”. É bom que se diga que o livro do Gênesis tem sido
estruturado de diversas formas. Alguns tem sugerido que o livro possui várias
seções, embora tais estruturas, não sejam facilmente percebida em nosso idioma.
“Isso ocorre porque, na maioria das traduções, a palavra hebraica toledoth é traduzida por mais de uma
expressão em português. A
expressão hebraica completa ’elleh
toledoth, que aparece onze vezes no livro de Gênesis.”[6]
"ESSAS SÃO AS GERAÇÕES DE..."
|
||
Fórmula
|
Conteúdo
|
Referência
|
No princípio, criou Deus... |
Criação
|
1.1 – 2.3 |
Esta é a gênese dos céus e da terra |
Criação
|
2.4 – 4.26 |
Este é o livro da genealogia de Adão |
Genealogia de Sete a Noé |
5.1 – 6.8 |
Eis a história de Noé. |
Dilúvio & Aliança |
6.9 – 9.29 |
São estas as gerações dos filhos de Noé, Sem, Cam e Jafé |
Base das nações & Babel |
10.1 – 11.9 |
São estas as gerações de Sem |
Genealogia de Sem a Abrão. |
11.10-26 |
São estas as gerações de Tera. |
História de Abrão |
11.27 – 25.11 |
São estas as gerações de Ismael, filho de Abraão, |
Genealogia de Ismael |
25.12-18 |
São estas as gerações de Isaque, filho de Abraão. |
Transmissão de bênção de Isaque para Jacó |
25.19 – 35.29 |
São estes os descendentes de Esaú |
Genealogia de Esaú |
36.1-43 |
Esta é a história de Jacó |
José & Israel no Egito |
37.1 – 50.26 |
Estas fórmulas tratam-se de materiais escritos
previamente, antes mesmo de Moisés existir, que pode ser provado em Gênesis 5.1
que trata do “livro das gerações de Adão” conforme lemos no próprio texto
hebraico: “סֵ֔פֶר תּוֹלְדֹ֖ת ” – Sefer Tholedoth.
Então, já havia uma tradição escrita da qual o autor do livro de Gênesis fez
uso.
2. Parece haver indicações de autoria múltipla no texto de
Gênesis.
Outra dificuldade que encontramos em respeito à autoria
mosaica do livro de Gênesis está no fato de que o próprio livro parece indica
que há mais de um autor em sua composição final. Vejamos alguns exemplos:
2.1 – O caso da venda de José (Gênesis 37.25-28):
A questão é que a passagem narra a venda de José o filho
preferido de Jacó. E a questão perturbadora no texto é a seguinte: Para quem os
filhos de Jacó venderam José? Para os Ismaelitas ou Medianitas ? Alguns sugerem
que havia dois relatos da venda de José por causa dessa alternância dos nomes;
implicando, que o texto não é fruto de um único autor.
“Os dois termos são usados de forma intercambiáveis
(Juízes 8.24); “Daí parece que “ismaelita” era um termo inclusivo, abrangendo
os primos nômades de Israel (Ismael era o rebento mais velho de Abraão), mais
ou menos como o termo “ árabe” abarca numerosas tribos em nossa maneira de
falar, podendo alternar com um dos seus nomes sem ofensa ou erro.”[7]
2.2 – O Relato da criação (Gênesis 1 e 2)
Ambos os relatos foram escritos de
uma perspectiva diferente e até com pontos de tensão. Por exemplo, em Gênesis 1
a vegetação e criado no terceiro dia e o homem no sexto. Já em Gênesis 2.5 é
nos dito que o casal é edênico foi criado quando não havia erva alguma no
campo. A explicação que muitos oferecem é de que se trata de dois relatos escritos
por autores diferentes. Todavia, a narrativa se concentra na ordem lógica, “a
saber, que quando Deus fez a terra, esta não era inicialmente o hospitaleiro
lugar que conhecemos (Não havia ainda
nenhuma planta... ainda nenhuma erva, 5)”[8].
A linguagem aqui é informativa. O autor informa ao leitor o processo da
criação.
[1]
LONGMAN III, Tremper. Como Ler Gênesis. Tradução:
Marcio Loureiro Redondo. São Paulo: Vida Nova, 2009, p.47.
[2] Idem.
[3] YOUNG, Edward J. Una Introducción Al Antiguo Testamento, MI:
TELL, 1991, p.32.
[4]LONGMAN
III, Tremper. Como Ler Gênesis. Tradução:
Marcio Loureiro Redondo. São Paulo: Vida Nova, 2009, p.50
[5]
Deixamos claro que cremos na revelação que Deus fez de si mesmo por meio da
instrumentalidade dos homens chamados por ele mesmo; tais como o próprio Moisés
que recebeu diretamente das mãos de Deus os dez mandamentos.
[6]
LONGMAN III, Tremper. Como Ler Gênesis. Tradução:
Marcio Loureiro Redondo. São Paulo: Vida Nova, 2009, p.72
[7]
KDINEY, Derek, Gênesis – Introdução e
Comentário, Tradução: Odayr Olivetti, São Paulo: Vida Nova, P.171
[8] Ibid, p.56.