A INTERPRETAÇÃO DO APOCALIPSE
Rev.
David Chilton
Tradução:
Rev. João Ricardo Ferreira de França.
Logo de inicio, enfrentamos dois
problemas quando tentamos estudar o Apocalipse. O primeiro é a questão de
estarmos seguros de que a nossa interpretação é correta – colocando limites em
nossa imaginação para não forçar a Santa Palavra de Deus a entrar em molde de
nossa própria invenção. Devemos permitir que o livro de Apocalipse diga o que
Deus pretendeu dizer. O segundo problema
é a questão da ética – que fazer com o que temos aprendido.
O modelo bíblico
de interpretação.
No próprio versículo primeiro de
Apocalipse, João nos proporciona uma importante chave interpretativa: “Revelação
de Jesus Cristo, que Deus lhe deu para mostrar aos seus servos as coisas que em
breve devem acontecer e que ele, enviando por intermédio do seu anjo, notificou
ao seu servo João,” (Apocalipse 1.1 ARA). O uso do termo “Notificou [declarou]” nos fala que a
profecia não deve ser considerada simplesmente como “história escrita antecipadamente”. Em vez
disso, Apocalipse é um livro de sinais:
representações simbólicas dos acontecimentos vindouros. Os símbolos não
deve m entender-se de maneira literal. Podemos ver isto no uso que João faz do
termo em seu evangelho (veja-se João 12.33; 18.32;21.19). Em cada caso, está se
usando no sentido de que Cristo significou
um evento futuro mediante uma indicação mais ou menos simbólica, mas por meio
de uma descrição clara e literal. E esta é geralmente as formadas das profecias
em Apocalipse. Isto não significa que os símbolos sejam ininteligíveis e
que a interpretação não esteja disponível. Por outro lado, não estou dizendo
que os símbolos estão em alguma espécie de código, de modo que tudo o que
necessitamos é um dicionário ou uma gramática de simbolismo para “traduzir” os
símbolos para o idioma português. A profecia é profecia, não alegoria ingênua
ou estática. A única maneira de entender seu simbolismo é familiarizando-se com
a Bíblia. O modelo bíblico de interpretação é a própria Bíblia.
Já
temos tomado nota das falácias e inconsistências involucradas na assim chamada
escola “literalista” de interpretação bíblica. Outro problema, que é
especialmente sério entre os teólogos “pop” é sua interpretação arbitrária dos
símbolos proféticos. Tenho ouvido
pregadores falar dos escorpiões de Apocalipse 9.3-11 como que mostram umas
desconcertantes variedades de horrores: Bombardeios, projéteis balísticos, helicópteros
Cobra, e até as temidas “abelhas assassinas” da América do Sul. Qual destes
representam os gafanhotos? Sem um modelo de
interpretação, não há maneira objetiva alguma de sabê-lo – e assim, o livro de
Apocalipse se torna, na prática, o
que seu próprio título insiste que não é:
uma mixórdia ininteligível de fogo e
vento “apocalípticos” que não significam nada.
Na
realidade, João nos disse milhares de vezes durante todo o livro de Apocalipse
exatamente o que é o modelo de
interpretação, porque o livro está positivamente abarrotado de citações do
Antigo Testamento e alusões a ele. O
livro de Apocalipse depende do Antigo Testamento muito mais que qualquer outro
livro do Novo Testamento. Por si só, este fato deveria advertir-nos que não
podemos começar a penetrar em seu significado sem uma sólida compreensão da
Bíblia como um todo – esta é a razão para que eu tenha escrito a segunda parte
deste livro, e por que estou repisando sobre o tema novamente. As igrejas
primitivas possuíam essa classe de compreensão. O evangelho havia sido pregado
primeiramente aos judeus e aos prosélitos gentios; frequentemente, as igrejas
haviam sido formadas por adoradores em sinagogas, e isto ocorria até nas
igrejas da Ásia Menor (Atos 2.9; 13.14; 14.1; 16.4; 17.1-4,10-12,17;
18.4,8,19,24-28; 19.1-10,17). Também, está clara em Gálatas 2.9 que o
ministério do Apóstolo João era para os judeus em particular. Por conseguinte,
os primeiros leitores do Apocaliçse estavam mergulhados no Antigo Testamento
até um ponto em que a maioria de nós não o está hoje em dia. O simbolismo de
Apocalipse está saturado de alusões bíblicas que eram comumente compreendidas
pela igreja primitiva. Ainda que nas raras congregações que não tinham nenhum membro hebreu, as Escrituras
usadas no ensino e no culto eram principalmente do Antigo Testamento. Os
cristãos primitivos possuíam a chave autorizada e infalível para o significado
das profecias de João. O que os modernos não apreciam este fato crucial é a
causa principal de nossa incapacidade para entender do João está falando.
Por
exemplo, consideremos um símbolo de Apocalipse, do qual se tem abusado muito, e
apliquemos este princípio. Em Apocalipse 7,9,14 e 22, João vê o povo de Deus selados
em suas fontes com seu nome; e em Apocalipse 13.16, João escreve sobre os
adoradores da besta, que tem sua marca na mão direita e na fronte. (diga-se de
passagem: não lhe parece estranho que todo mundo esteja tão excitado sobre ‘a
marca da besta’ quando a clara ênfase em Apocalipse é sobre o selo de Deus nas fontes dos crentes?) Tem-se feito muitas e fantásticas interpretações em relação a estas marcas – que vãos desde
tatuagens e ingressos de parques de diversões até o código de barras da conta
do cartão de crédito e o numero da Previdência Social – e tudo sem observar as
mínimas alusões bíblicas mais claras. Mas o que haveriam pensado os primeiros
leitores destas passagens? Os símbolos lhes haveriam feito pensar imediatamente
nas várias referências bíblicas: a “marca” do suor na fronte de Adão,
significando a maldição de Deus por sua desobediência (Gênesis 3.19); a fronte
do sumo sacerdote, marcada com letras de ouro proclamando que agora era SANTO
AO SENHOR (Êxodo 28.36); Deuteronômio 6.6-8 e Ezequiel 9.4-6, em que os servos
de Deus são “marcados” na mão e na fronte com a lei de Deus, e recebem assim
benção e proteção em nome de Deus. Por outro lado, os seguidores da besta
recebem sua marca e propriedade: submetendo-se a lei ímpia, estadistas,
anticristã. Em Apocalipse, a marca não deve ser tomada literalmente. É uma alusão
a um símbolo do Antigo Testamento que falava da total obediência de um homem a
Deus, e represente uma advertência de que o deus de uma sociedade – seja o Deus
verdadeiro ou o estado deificado – exige completa obediência a seu domínio.
Este
será o princípio de interpretação que se seguira neste livro. A Revelação[1]
é uma revelação: o propósito é que se
entenda. Contudo, não o entenderão os preguiçosos e os indisciplinados que
buscam emoções, que tem tanta pressa que não possuem tempo para estudar a
Bíblia. Muitos passam apressadamente desde sua primeira profissão de fé até o
último livro da Bíblia, tratando-o como mais um livro de alucinações, desdenhando
apressadamente de um sombrio intento de permitir que a Bíblia interprete a si
mesma – descobrindo, no final das contas, só um reflexo de seus próprios
preconceitos. Porém, para os que prestam atenção à Palavra de Deus como um
todo, a mensagem é clara. Benjamin Warfield escreveu:
O
Apocalipse de João não necessita ser outra coisa que fácil: todos os seus
símbolos são ou naturalmente óbvios ou tem suas raízes nos poetas e profetas do
Antigo Testamento e a linguagem figurada de Jesus e seus apóstolos. Ninguém que
conheça sua Bíblia necessita se desesperar para ler este livro com proveito.
Sobre tudo, o que pode entender o grande discurso de nosso Senhor concernente
as últimas coisas (Mateus 24) não pode deixar de entender o apocalipse, que se
baseia nesse discurso, e escassamente avança mais além do que ele[2]
Profecia e
ética.
Também, o livro de Apocalipse é
tratado como exemplo do gênero “apocalíptico” de escritos que floresceram entre
os judeus entre o ano de 200 a.C e o ano 100 d.C. Não há nenhuma base em
absoluto para esta opinião, e é completamente infeliz que a palavra apocalíptico seja usada para descrever
esta literatura. (os mesmos escritores de literatura “apocalíptica” nunca
usaram o termo neste sentido; também, os eruditos roubaram o termo de João, que
chamou seu livro “o apocalipse [a
revelação] de Jesus Cristo”). Na realidade, há muitas e grandes diferenças
entre os escritos “apocalípticos” e o livro de Apocalipse.
Os “apocalipsistas” se expressam em
símbolos inexplicáveis e ininteligíveis, e geralmente não tinham nenhuma
intenção de fazer-se entender. Seus escritos abundam em pessimismo: não é
possível nenhum verdadeiro progresso, nem haverá nenhuma vitória para Deus e
seu povo na história. Nem sequer podemos ver a Deus na história. Tudo o que
sabemos é que o mundo está se tornando pior e pior. O melhor que podemos fazer
é esperar o fim – e pronto. Porém, por
este momento, as forças do mal estão sob controle . (lhe soa familiar?). O
resultado prático foi que os apocalipsistas rara vez se preocupavam com a
conduta ética. Não lhes interessava muito como viver no presente (e na
realidade assumir o domínio seria impensável); só queriam especular sobre os cataclismos
futuros.
O
enfoque de João no Apocalipse é vastamente diferente. Seus símbolos não são
obscuras divagações incubadas em uma imaginação febril; estão firmemente
enraizadas no Antigo Testamento ( e a razão de sua aparente obscuridade é isso
mesmo: temos problemas para entendê-los simplesmente não conhecemos as nossas
Bíblias). Em contrastes com os apocalipsistas, que haviam abandonado a
história, João apresenta a história como o cenário da redenção: Deus salva a
seu povo em seu ambiente, e fora
dele; e Deus salva o ambiente.
Leon
Morris, em seu importante estudo de Apocaliptica
(Eerdmans, 1972), descreve a visão mundial de João: “ Para ele, a história é a
esfera em que Deus tem forjado nossa redenção. O que realmente crítico na
história da humanidade já tem seu lugar, e teve lugar aqui, nesta terra, nos
assuntos dos homens. O cordeiro ‘como imolado’ domina o livro por completo.
João vê a Cristo como vitorioso, e havendo obtido a vitória sobre a morte, um
evento na história. Seu povo compartilha de seu triunfo, por tem derrotado a
Satanás ‘pelo sangue do cordeiro e pela palavra de seu testemunho” (Apocalipse
12.11). Está ausente o pessimismo que difere da atividade salvadora de Deus até
o fim. Ainda que João apresenta o mal realisticamente, seu livro é
fundamentalmente otimista” (p.79).
Os
apocalipsistas disseram: O mundo se
aproxima de seu fim: rendam-se! Os profetas bíblicos disseram: O mundo se aproxima a seu princípio: Ponha-se a trabalhar!
Assim,
pois, o livro de Apocalipse não é um tratado de apocalíptica; mas devidamente,
é, como João mesmo nos lembra repetidamente, uma profecia (Apocalipse 1.3; 10.11; 22.7,10, 18-19), de acordo com
os escritos de outros profetas bíblicos . E – novamente em profundo contraste
com os apocalipsistas – se houve uma preocupação principal entre os profetas
bíblicos, foi a conduta ética. Nenhum escritor bíblico jamais revelou o futuro
só para satisfazer a curiosidade: o objetivo foi sempre dirigir ao povo de Deus
sobre ações corretas no presente. A esmagadora maioria das profecias bíblicas
não tinha nada haver com o errôneo conceito de que a “profecia” predizia o
futuro. Os profetas falavam do futuro para estimular a vida piedosa. O propósito da profecia é ético.
O fato de que muitos dos que estudam os
escritos proféticos na atualidade estão mais interessados em encontrar
possíveis referências a viagens espaciais e armas nucleares que em descobrir os
mandamentos de Deus para a vida é um repugnante tributo à moderna apostasia. “O
testemunho de Jesus é o espírito de
profecia” (Apocalipse 19.10); ignorar a Jesus em favor de explosões atômicas é
uma perversão da Escritura, uma extravagante distorção da Santa Palavra de
Deus. Do princípio ao fim, João está intensamente interessado na conduta ética
dos que lêem o livro do Apocalipse:
“Bem-aventurados
aqueles que lêem e aqueles que ouvem as palavras da profecia e guardam as
coisas nela escritas, pois o tempo está próximo” (Apocalipse 1.3 ARA).
“Bem-aventurado
aquele que vigia e guarda as suas vestes”(Apocalipse 16.15 ARA)
“Bem-aventurado
aquele que guarda as palavras da profecia deste livro”. (Apocalipse 227 ARA).
“Bem-aventurados
aqueles que guardam os seus mandamentos,” (Apocalipse 22:14 ACF).
Devo sublinhar que, ao argumentar a
favor da escatologia do domínio, não
estou simplesmente apresentando um programa alternativo como guia para o
futuro. A escatologia bíblica não é só um calendário de eventos especiais. O
significado fundamental da esperança é o
senhorio de Jesus Cristo. O objetivo da escatologia é levar as pessoas a
adorar e servir ao seu Criador. A profecia nunca é meramente um exercício
acadêmico. Todos os profetas apontavam para Jesus Cristo, e todos eles
exigiam uma resposta ética. A palavra de
Deus exige uma total transformação de nossas vidas, em todo o momento. Se esse
não é o objetivo, e o resultado, de nosso estudo da Escritura, não nos servirá
de nada.
Muito bom!
ResponderExcluirParabéns pelo texto!
ResponderExcluirQual seria sua opinião sobre este livro? Preciso de uma opinião sobre as falhas ( se houver) na interpretação que existe neste livro.
http://www.reformedonline.com/uploads/1/5/0/3/15030584/premil_portuguese.pdf