COMO LER AS PROFECIAS.
Por: Rev. David Chilton
Tradução: Rev. João Ricardo Ferreira de França
Iniciei
minha viagem pessoal até a escatologia do domínio em uma noite na igreja faz
doze anos. O pastor, um pregador famoso por seu método expositivo em seu ensino
bíblico, acabava de iniciar uma série de conferências sobre profecia. Enquanto
ele defendia eloqüentemente sua escatologia da derrota, me impressionou o fato
de que parecia completamente incapaz de desenvolver seus pontos de vista a
respeito da Bíblia organicamente. Oh,
citava alguns textos – um versículo aqui, outra acolá. Porém nunca conseguiu
demonstrar que sua explicação do futuro encaixava no padrão geral da Bíblia. Em
outras palavras, era muito hábil sobrepondo as suas visões da realidade sobre o
texto bíblico, assegurando-se de que seus versículos fossem organizados na
ordem correta. Entretanto, não pode mostrar como suas doutrinas fluíam da
Escritura; sua escatologia não parecia ser uma parte orgânica daquilo que o
relato da Bíblia conta. Daí eu comecei a perceber naquela noite que o caminho
para recuperar a escatologia bíblica deve ser a compreensão da narrativa
bíblica. Em vez de tentar fazer o ajuste da Bíblia em um molde previamente
combinado, devemos tentar descobrir os moldes que já estão lá.
Devemos permitir que a estrutura da própria Bíblia surja do próprio texto, quer
colocar nossa própria interpretação. Devemos nos acostumar ao vocabulário
bíblico e aos modos de expressões bíblicas, buscando conformar nossos próprios
pensamentos aos termos das categorias bíblicas.
Essa perspectiva lança luz
inestimável na velha discussão sobre a interpretação da interpretação
"literal" versus "simbólica". Em grau elevado, esse debate
está fora de lugar, porque o fato é que todos intérpretes são
"literalistas" em alguns lugares e "simbólicos" em outros. Por
exemplo, estou examinando um recente comentário sobre Apocalipse, escrito por
um bem conhecido erudito evangélico. A contracapa proclama ousadamente: “Esta é provavelmente a exposição mais
literal do Apocalipse que você jamais tenha lido”! Contudo, olhando mais de
perto, o comentário na realidade ensina uma interpretação altamente simbólica
de muitos pontos da profecia. Eis aqui alguns deles:
1.
As “vestiduras manchadas” dos cristãos de Sardis (Apocalipse 3.4)
2.
A promessa de que os cristãos se converterão em “colunas” do templo (3.12)
3.
A temperatura “morna” dos laodicenses (3.15-16)
4.
Oferta de Jesus para vender "ouro", "vestes brancas" e
"Colírio" (3.18)
5.
Jesus “batendo” a “porta” (3.20)
6.
O “Leão da Tribo de Judá” (5.5)
7.
O “Cordeiro” que tinha “sete olhos” (5.6)
8.
As “oliveiras” e os “candeeiros” (11.4)
9.
A “mulher vestida de sol” (12.1)
10.
O “grande dragão vermelho” (12.3)
11.
A “besta” de sete cabeças (13.1)
12.
A “grande meretriz que está sentada sobre muitas águas” (17.1)
Poucos “literalistas” não
concordariam com a ideia de que estas imagens de Apocalipse se deve entender
simbolicamente. Contudo, o que temos de reconhecer é que também se usam
símbolos em todo o resto da Escritura, bem próximo da linguagem literal. Isto
ocorre porque a Bíblia é literatura:
literatura divinamente inspirada e infalível, mas ainda literatura. Isto
significa que temos que lê-la como
literatura. Algumas partes tem o propósito de se entendidas literalmente e, em
conseqüência, tem sido escritas assim – como história, ou proposições
teológicas, o que seja. Porém, ninguém esperaria ler os Salmos ou Cantares de
Salomão com os mesmos moldes literários usados para o livro de Romanos. Seria
como ler o solilóquio de Hamelet “literalmente”: "As pedras e flechas da
ofensiva fortuna... pegar em armas contra um mar de problemas ... ".
Veja você, não podemos entender o
que Bíblia realmente significa (literalmente) a menos que apreciamos a maneira
em que usa os estilos literários.
Entenderíamos corretamente o Salmo 23 se o tomarmos “literalmente”? Se o
fizermos, não soa um pouco tolo? Na verdade, se tomado literalmente, não seria verdadeiro: Porque me atrevo a dizer que
o Senhor não faz com que cada cristão
repouse em pastos verdejantes literais. Porém, de modo geral, não cometemos
esses toscos erros ao ler a poesia bíblica. Sabemos que está escrita em um
estilo que muitas vezes usa a linguagem simbólica. Porém, temos que levar em
conta que o mesmo ocorre com os profetas: eles também falavam em poesia, em
figuras e símbolos, utilizando a rica herança de imagens bíblicas que, como
veremos, na realidade começaram no paraíso original – o Jardim do Éden.
E, certamente, é ali onde começa a
profecia. E vale a pena observar que a primeira promessa do Redentor vindouro
se expressou em termos altamente simbólicos. Deus disso a serpente: “Porei
inimizade entre ti e a mulher, entre a tua descendência e o seu descendente.
Este te ferirá a cabeça, e tu lhe ferirás o calcanhar”. (Gênesis 3.15).
Por conseqüência, a verdadeira
pergunta com a que temos que começar não é algum debate artificial entre
simbolismo e literalismo, mas um ponto muito mais básico: Deve nossa
interpretação ser bíblica ou especulativa? Em outras palavras, quando
trato de entender ou explicar algo da Bíblia, devo ir a própria Bíblia para
encontrar as respostas, ou devo inventar algo “criativo” por minha própria
conta? Formular a pergunta desta forma é mais exato, e produzirá resultados
mais frutíferos. Permita-me usar um exemplo extremo para explicar o que quero
dizer. O livro de Apocalipse descreve a uma mulher vestida de sol, com a lua
nos pés, e em dores de parto, enquanto um dragão fica ao redor para devorar seu
filho. Provavelmente, um intérprete especulativo
se voltaria primeiro para as noticiais sobre os experimentos genéticos mais
recentes para estabelecer se o tamanho e a composição química da mulher
poderiam alterar-se o suficiente para vestir-se de sol; também averiguaria se o
mostro do Lago Ness tinha saído para a superfície recentemente. Por outro lado,
um intérprete bíblico começaria por
se perguntar: de qual parte da Bíblia vem esta imagem? A onde a Bíblia fala de
uma mulher em dores de parto, qual é a sua importância nestes contextos? Onde a
Bíblia fala de um dragão? Onde a Bíblia fala de alguém que tratar de assassinar
um bebê? Se vamos procurar entender a mensagem da Bíblia, temos que adquirir o
hábito de fazer perguntas como estas. Por conseguinte, cada enfoque tem seus
inconvenientes. Os principais inconvenientes do método bíblico é que, de modo geral, requer mais trabalho, e
necessita-se estar mais familiarizado com a Bíblia. O principal inconveniente
do método especulativo, com todo o
seu sensacionalismo, é que simplesmente não é bíblico.
A Linguagem dos Profetas
Como
mencionei acima, grande parte da Bíblia foi escrita em símbolos. Uma forma útil
de entender isto, talvez, seria falar destes símbolos como uma série de moldes e associações. Com isto quero dizer que o simbolismo bíbilico não é um código. Em
vez disso, é uma forma de ver, uma perspectiva. Por exemplo, quando Jesus fala
de “água da vida” (João 4.10), reconhecemos corretamente que está usando a água
como símbolo. Entendemos que, quando ele falou para a mulher junto ao poço, não
estava lhe oferecendo somente “água”. Estava-lhe oferecendo a vida eterna.
Porém, a chamou “água”.
Imediatamente, devemos perguntar: Por
que fez isso? Poderia haver dito simplesmente “vida eterna”. Por que falou em
metáforas? Por que queria que ela pensasse em água?
Pois
bem, aqui é onde podemos cometer um grave erro, e este é o principal erro de
alguns intérpretes que tratam de utilizar um enfoque “simbólico”. É crer que o
simbolismo bíblico é principalmente um quebra-cabeça que temos que resolver. E
de imediato temos que decidir: “Ah! Água
é uma palavra chave especial que significa vida eterna. Isso significa que, cada vez que a Bíblia fala de água
simbolicamente, na realidade está
falando de vida eterna; cada vez que alguém bebe algo, na realidade está se convertendo em cristão”. Simplesmente, não
funciona assim (como você o verá se trata de aplicar isto em toda a Bíblia).Também,
que sentido teria que a Bíblia simplesmente colocasse tudo no centro? A Bíblia
não é um livro para espias nem sociedades secretas; é a revelação de Deus acerca de Si mesmo para o seu povo do pacto. A
interpretação mística, como de resolver um enigma, tenda ser especulativa; não
presta suficiente atenção para a maneira em que a própria Bíblia fala.
Quando
Jesus ofereceu “água” para a mulher, queria que ela pensasse nas múltiplas
imagens relacionadas com a água na Bíblia. Claro que, em sentido geral, sabemos
que a água está associada com o refrigério espiritual e a sustentação da vida
que vem com a salvação. Porém, as associações bíblicas com a água são muito
mais complexas do isso. Isto é porque entender
o simbolismo bíblico não significa decifrar um código. Se parece mais com
ler um boa poesia.
O
simbolismo da Bíblia não está estruturado com um estilo cheio, de isto significa aquilo. Em seu lugar, se
tem de ler visualmente. Devemos ver
as imagens surgir diante de nós em sucessão, página após página,
permitindo-lhes que evoquem uma resposta em nossas mentes e nossos corações. Os
profetas não escreveram para criar exercícios intelectuais estimulantes.
Escreveram para ensinar. Escreveram
em símbolos visuais dramáticos; e se queremos entender plenamente sua mensagem,
nós temos que apreciar seu vocabulário. Temos que ler a Bíblia visualmente. Os
próprios símbolos visuais, e o que a Bíblia diz a respeito deles, são aspectos
importantes do que Deus quer que aprendamos; do contrário, não haveria falado
desta maneira.
Assim
que, quando a Bíblia nos conta uma história sobre água “na realidade” não nos
está falando de nada mais; está-nos falando de água. Mas, ao mesmo tempo, se espera que vejamos a água e que pensemos nas associações bíblicas com respeito à água. O sistema de
interpretação oferecido aqui não é nem “literalista” e nem “simbólico”;
toma a “água” de forma real e
literalmente, porém também toma de modo real o que a Palavra de Deus associa
com a água através de toda a história da revelação bíblica.
Quais
são algumas da associações bíblicas que poderiam haver ocorrido à mulher junto
ao poço, e aos discípulos? Eis aqui algumas delas:
- A
massa aquosa, fluída, que era a natureza original da terra na criação, e
da qual Deus toda a terra (Gênesis 1);
- O
grande rio do Éden que regava toda a terra (Gênesis 2);
- A
Salvação de Noé e de sua família por meio das águas do dilúvio (Gênesis
6-9);
- As
revelações de Deus por graça a Hagar ao lado de uma fonte (Gênesis 16) e
de um poço (Gênesis 21);
- O
poço chamado Reobote, onde Deus deu domínio a Isaque (Gênesis 26);
- O
rio do qual o bebê Moisés, o futuro libertador de Israel, foi tirado e se
converteu em príncipe (Êxodo 2);
- A
atravessia redentora do Mar vermelho, onde Deus novamente salvou a seu
povo por meio da água (Êxodo 14);
- A
água que fluiu da Rocha ferida no Sinaí, dando vida ao povo (Êxodo 17);
- As
várias cerimônias rituais do Antigo Testamento, significando a remoção da
sujeira, a contaminação, a enfermidade e a morte, a imposição do Espírito
Santo aos sacerdotes (por exemplo, Levítico 14; Números 8);
- A
atravessia do rio Jordão (Josué 3)
- O
som estrondoso de águas causados pela coluna de nuvem (Ezequiel 1)
- O rio da vida que fluía desde to templo e
limpava o Mar Morto (Ezequiel 47)
Assim
que, quando a Bíblia fala de água, se
supõe que tenhamos em mente uma vasta hoste de conceitos associativos, uma
complexidade de imagens bíblicas que afeta nossos pensamentos sobre a água.
Para dizer de uma forma diferente, se supõe que a água seja como um “murmúrio”,
um termo que evoca muitas associações e conotações. Quando lemos a palavra água, deve lembrar-nos os atos
salvadores e as revelações redentoras de Deus por meio dá água através da
Escritura. A Bíblia usa muitos destes “murmúrios”, e o número deles aumenta a
medida que se avança até que, para quando chegamos ao apocalipse (a cabeça angular
da profecia), todas elas vem de uma só vez até nós em grande velocidade, em uma
ventania de referências associativas, algumas as quais são óbvias, outras
obscuras. Para aquele que realmente conhece sua Bíblia e tem observados os
padrões literários e as imagens literárias, grande parte do livro lhe parecerá
familiar; para o resto de nós, é confuso. Em Apocalipse somos confrontados por
todas as conotações bíblicas de numerosas imagens: não somente de água, mas
também de luz, fogo, nuvens, anjos, estrelas, lâmpadas, alimentos, rochas,
espadas, tronos, arco-íris, vestiduras, tronos, vozes, animais alados, aves de
rapina, olhos, chaves, trombetas, pragas, montanhas, ventos, mares, altares,
sangue, lagostas, árvores, cabeças, chifres, e coroas.
O
Apocalipse também nos apresenta imagens de uma mulher, um dragão, um deserto,
uma marca na fronte, uma foice, pérolas, um lagar, um cálice de vinho, uma
rameira, um rio, Sodoma, Egito, Babilônia, ressurreição, um casamento, uma ceia
de casamento, o Esposo, a cidade / esposa em forma de uma pirâmide. E
prontamente está o uso de números simbólicos: dois, três, quatro, sete, dez,
doze, e múltiplos deles – 24, 42,144, 666, 1000, 1260, 7000, 12000 e 144000.
Por
isso, é necessário entender a Bíblia e o uso que ela faz de símbolos e padrões
se é que alguma vez vamos entender o livro de Apocalipse. Os seguintes
capítulos sobre o tema do Paraíso na Escritura estão desenhados para
introduzir ao leitor no uso que a Bíblia
faz de imagens. Essencialmente, isto é um exercício em Teologia Bíblica, o termo técnico para designar o estudo da
revelação progressiva de Deus sobre a salvação. No principio, toda a história
da redenção se ensina nos primeiros capítulos da Bíblia: o resto simplesmente se constrói sobre o fundamento
lançado ali. Por isso, como veremos mais adiante, as revelações posteriores
dependem em grande parte do Jardim do Éden.
Ao
iniciar este estudo das imagens bíblicas, revisemos as regras básicas:
1. Leia visualmente;
trate de representar-se o que a
Bíblia está dizendo.
2. Leia Biblicamente,
não especule nem faça abstrações, mas preste muita atenção ao que a própria
Bíblia diz sobre seus próprios símbolos.
3. Leia o relato;
trate de pensar em como contribui cada elemento da Bíblia a sua mensagem de
salvação como um todo.
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