O TEMA DO PARAÍSO
Por: Rev. David Chilton
Tradução: Rev. João Ricardo Ferreira de França.
Começaremos,
pois, com a criação do mundo e com Deus seu criador, porque o primeiro fato que
se deve captar é este: A renovação da
criação tem sido elaborada pelo mesmo Verbo que criou a terra no princípio.
Não há, pois, nenhuma inconsistência entre a criação e a salvação, porque o Pai
tem empregado o mesmo Agente para ambas obras, efetuando a salvação do mundo
por meio do mesmo Verbo que o criou no princípio.
Atanásio, On the Incarnation [I]
A história do
Éden contém três ideias básicas, conceitos que nos confrontam repetidamente ao
estudar a Bíblia: a criação, a queda, e a redenção em Cristo. Ao desenvolver
estas ideias através da história da salvação, vemos imagens e ações familiares
que reaparecem e padrões que começam a tomar forma, até que o último livro da
Bíblia finalmente responde a todas as perguntas que começam no primeiro livro.
A revelação de Deus acerca de si mesmo é um todo
coerente, consistente; e chega até nós em formas literárias mui formosas.
Nossa correta interpretação da mensagem será incorreta, a menos que intentemos
entender e apreciar a forma em que essa mensagem é comunicada. Ao começar nosso
estudo de onde a própria Bíblia começa, podemos entender mais prontamente, não
só o livro de Apocalipse, mas a própria Bíblia – por que os escritores da Bíblia disseram o que disseram da forma em
que o disseram. E nossas razões para fazê-lo assim é que, deste modo, podemos
confiar mais plenamente nas promessas de Deus, obedecer a seus mandamentos, e
herdar suas bênçãos.
A Natureza da
Salvação.
Um dos temas básicos da Escritura é
que a salvação restaura ao homem a seu
propósito original. No princípio, Deus criou o homem a sua própria imagem,
para que o home tivesse domínio
(Gênesis 1.26-28). Essa tarefa de domínio começou no Jardim do Éden, porém não
se suponha que terminasse ali, porque ao homem foi ordenado ter domínio sobre
toda a terra. Adão e Eva (e seus filhos) haveriam de estender as bênçãos do
paraíso ao mundo inteiro. Porém, quando o homem se rebelou, perdeu a capacidade
de ter o domínio divino, porque perdeu a comunhão com seu Criador. Ainda que o
homem caído é todavia a imagem de Deus (Gênesis 9.6), agora é uma imagem desnuda (Gênesis 3.7), porque perdeu a
sua cobertura original – a glória de Deus (Romanos 3.23).
A
imagem de Deus permanece, até certo ponto, em todos os homens, porém a imagem
está torcida, defeituosa, desfigurada, e rachada como resultado do pecado. E a
terra, da qual se havia planejado para se converter no Jardim-Templo de Deus,
em vez disso se converteu em um deserto de espinhos, abrolhos, suor, escassez,
contaminação, e morte (Gênesis 3.17-19; Isaías 24.1-6; Romanos 5.12). O homem
foi expulso do Jardim, e se lhe proibiu o retorno para entrar. Mas esse não é o
fim da história. No mesmo dia em que Deus pronunciou juízo sobre o home e a
terra, pronunciou um juízo maior sobre o tentador, declarando que o Redentor
viria algum dia para esmagar a cabeça da serpente (Gênesis 3.15). Em
consequência, o apóstolo João nos diz que “O
Filho de Deus apareceu para este propósito, para destruir as obras do diabo”(
1ª João 3.8). Cristo veio como segundo Adão, para desfazer o dano causado por
meio do primeiro Adão ( 1ª Coríntios
15.22,45; Romanos 5.15-19). Deus havia soprado em Adão o hálito (em hebraico, o Espírito)
da vida, mas a rebelião de Adão trouxe a morte ao mundo. Na salvação, Cristo
sopra novamente em seu povo o Espírito de vida (João 20.22) – a vida eterna,
que nos liberta da maldição do pecado e da morte (Romanos 8.2), o qual
restaurará finalmente na restauração toda a criação (Romanos 8.19-21). Em
Cristo, somos realmente uma nova criação
(2ª Coríntios 5.17), porque temos sido recriados à imagem de Deus (Efésios
4.24; Colossenses 3.10), e revestidos novamente com a glória de Deus (Romanos
8.29-30). E, desta vez, a seguridade da restaurada imagem de Deus está
garantida, porque nossa posição é no Cristo que nunca pode fracassar. NEle,
temos a vida eterna.
Isto
apresente outro padrão bíblico básico, um padrão tríplice que é assumido
durante boa parte do material deste livro, que veremos por diversas vezes
durante os nossos estudos. A Escritura apresenta a salvação em termos de uma
estrutura definitiva – progressiva –
final, e por isso as profecias bíblicas frequentemente parece que se
sobrepõem. A salvação se executou definitivamente
na obra perfeita e consumada de Jesus Cristo; é aplicada progressivamente e cada vez mais durante
esta era; pessoal e institucionalmente; e se alcançará finalmente, em seu cumprimento mais completo, no final da história
no dia final. Temos sido salvos (2ª Timóteo
1.9), estamos sendo salvos agora
(Filipenses 2.12-13), e seremos salvos
no futuro (1ª Pedro 1.9). Para dizê-lo de outra maneira, temos sido recriados à imagem de Deus (Efésios 4.24), estamos sendo recriados progressivamente à sua imagem (2ª Coríntios 3.18),
e esperamos o dia em que seremos recriados
perfeitamente à sua imagem (Filipenses 3.20-21).
Em consequência, a
salvação restaura o homem a seu chamado e a seu propósito originais, e garante
que esse mandato original do homem – exercer domínio sobre toda a terra sob a
autoridade de Deus – se cumprirá. Cornelius Van Til tem assinalado que a “revelação redentora de
Deus tinha que ser abrangente como
havia sido o pecado”. Na natureza do caso, a redenção devia ser para o mundo
inteiro. Isto não quer dizer que havia de salvar a cada pecador individual no
mundo. “Mas, significa que o universo criado, que é apenas uma unidade, também
deve ser salvo como uma unidade” (An
Introduction to Systematic Theology [ Presbyterian
and Reformed, 1974, p.133]). No fim das contas, a salvação bíblica reverte
a maldição, reverte as condições edênicas, repara as relações pessoais e
sociais, e bendiz a terra em todas as áreas. A terra inteira será salva, e
recriada no Jardim de Deus. “porque a terra será cheia do conhecimento do
SENHOR, como as águas cobrem o mar”(
Isaías 11.9).
Por
conseguinte, em um sentido muito real (e progressivamente, a medida que o
evangelho conquista o mundo), o povo de Deus sempre tem vivido “no jardim”. Por
exemplo, a terra do Egito se descreve em Gênesis 13.10 “como o jardim do
SENHOR” – e quando o povo do pacto foi viver ali, se lhe deu a terra de Gosén,
que era a melhor de todo o Egito
(Gênesis 45.18; 47.5-6,11,27) Nesta localidade edênica, frutificaram e se multiplicaram (Êxodo 1.7) – a mesma expressão que
no Mandamento original que Deus havia dado a Adão e Eva no Éden! Como era de
esperar-se, a terra prometida era uma terra na que grande parte da maldição se
havia revertido: era “como o jardim do Éden” (Joel 2.3), e, portanto, dela
“manava leite e mel” (Êxodo 3.8).
Como
veremos nas páginas seguintes, a restauração do Éden é um aspecto essencial da
salvação que Cristo proporciona. Quando o Antigo Testamento predisse a Vinda de
Cristo e as bênçãos que Ele traria, os profetas falavam repetidamente na linguagem
da restauração do Éden. Isaías escreveu: “Certamente consolará o SENHOR a Sião;
consolará a todos os seus lugares assolados, e tornará seu deserto em Paraíso,
e sua solidão como o jardim do SENHOR; gozo e alegria se achará nela, louvores,
e vozes de canto” (Isaías 51.3). E muitos anos depois, Ezequiel profetizou:
Assim
diz o SENHOR Deus: no dia e quem vos limpar de todas as vossas iniquidades,
farei também que sejam habitadas as cidades e as ruínas serão reedificadas. E a
terra que esteve assolada será lavrada, depois de ter permanecido assolada aos
olhos de todos os que passaram. E dirão: Esta terra que estava assolada veio a
tornar-se o jardim do Éden; e estas cidades que eram desertas, e assoladas e
arruinadas, estão fortificadas e habitadas. E as nações que restam a vosso
redor saberão que Eu, o SENHROR, reedificarei o que estava derribado, e plantei
o que estava desolado; Eu, o SENHOR, falei, e o farei. (Ezequiel
36.33-36)
Porém há muito mais do que
poderíamos notar a primeira vista nestas
profecias (e em outras) sobre a restauração do Éden. Na realidade, há muitas,
muitas passagens da Escritura que falam em termos dos padrões edênicos que não mencionam o Éden pelo nome. O tema do paraíso é recorrente em toda a Bíblia, desde o
Gênesis até o Apocalipse; porém, para reconhecê-lo, primeiro devemos
familiarizar-nos com que a Palavra de Deus
diz acerca do jardim do Éden em si mesmo.Deus se tem colocado no
trabalho de dar-nos informação muito específica sobre o jardim, e o resto da
Escritura está redigido sobre este fundamento, referindo-se a ele regularmente.
Note-se bem: este estudo não é meramente uma coleção de curiosidades, de “fatos
estranhos e interessantes sobre a Bíblia” (quer dizer, a classe de informação
irrelevante que frequentemente está nas seções ‘enciclopédicas’ das grandes
Bíblias familiares). Repito, é um tema bíblico principal, que ilumina
dramaticamente a mensagem de Apocalipse – e, de modo rápido, ajuda-nos a
entender a mensagem da Bíblia como um todo. Por isso, nos capítulos que seguem,
examinaremos as várias características do jardim do Éden, levando em
consideração especialmente como cada uma delas se converte em um “sub-tema”
em si mesmo, em termos do tema geral da
restauração edênica na salvação.
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